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Disjunções arminianas injustificadas

“Portanto, o que Deus ajuntou não separe o homem.” (Marcos 10.9)
Na tentativa de manter a coerência do sistema, o arminianismo é obrigado a criar algumas diferenciações artificiais em seus elementos e que carecem de fundamentação nas escrituras. Algumas são defendidas conscientemente, outras afloram quando um ponto em questão é pressionado. Em todo caso, mostram como o sistema padece de robustez, em consequência de negar doutrinas que lhe parecem desagradáveis. Vejamos três casos em que disjunções aparecem, embora vários outros pudessem ser elencados.

Introduzem discórdia de propósitos na Trindade

O primeiro e talvez o mais evidente deles tem a ver com os propósitos das pessoas da Trindade na obra da salvação. No arminianismo, o Pai decidiu salvar apenas os eleitos [1], ou seja, aquelas pessoas que Ele previu que iriam crer e perseverar [2]. Já o propósito do Filho é remir todas as pessoas sem exceção [3], daí Sua morte ter abrangência universal. Ora, se o propósito do Pai é salvar apenas os que creem e o propósito da morte do Filho é expiar o pecado de todas as pessoas indiscriminadamente, então a vontade do Filho está dissociada da vontade do Pai. Jesus morreu por pessoas a quem Deus não pretendia salvar e às quais o Espírito Santo não aplica os benefícios da morte do Filho.

Em toda a Escritura a salvação é obra da Trindade e as três pessoas estão em perfeita harmonia quanto ao escopo da salvação. Não vemos Deus elegendo alguns e não outros, ao passo que Jesus morre vicariamente no lugar de toda a humanidade e o Espírito converte apenas uma parte dos que Jesus remiu. Pelo contrário, na Bíblia aqueles que o Pai predestinou são exatamente os mesmos que o Filho resgatou e aos quais o Espírito chama e regenera.

Dividem a obra sacerdotal de Cristo

No seu primeiro discurso na universidade de Lyden, Armínio escolhe como tema a obra sacerdotal de Cristo. No seu discurso ele promove uma disjunção entre a tarefa sacrificial e a tarefa intercessória de Jesus, afirmando que Jesus morreu por todos, mas intercede apenas pelos crentes [4]. O motivo dessa mudança de escopo é que se Jesus intercedesse por todos e cada um daqueles por quem morreu, todo mundo seria inevitavelmente salvo, posto que nenhuma oração do Filho deixa de ser atendida pelo Pai [5]. Subjaz nesse motivo a diferença na eficácia da morte e da oração de Jesus, pois a primeira não é em si mesmo eficaz para salvar (carece de algo externo à morte de Jesus), enquanto que a oração tem eficácia absoluta.

O sistema sacrificial do Antigo Testamento indica claramente que o sacerdote intercedia pelas mesmas pessoas em favor de quem foi oferecido o sacrifício. E o Novo Testamento reforça que Jesus intercede por quem Ele morreu, e vice-versa. Separar Sua morte sacrifical de Sua oração sacerdotal não é bíblico e implica que o Pai rejeitaria àqueles por quem Jesus ofereceu Sua vida, mas não as rejeitaria se tão somente Jesus oferecesse uma oração em favor delas. A ruptura arminiana da obra de Cristo faz com que Sua oração seja mais aceitável diante de Deus que Seu sofrimento.

Distinguem salvos e eleitos

Uma terceira distinção artificial que o arminiano é levado a fazer é criar duas classes de salvos. Ele é forçado a isso para poder sustentar que um salvo pode vir a perder a salvação sem com isso comprometer a infalibilidade da presciência divina. Se Deus anteviu a fé de alguns e os elegeu baseado nela, não pode estar errado quanto a eles serem salvos e, portanto, todos os eleitos seriam infalivelmente salvos. Isto implicaria que a doutrina da segurança eterna é verdadeira, o que a maioria dos arminianos não está disposta a admitir. A saída encontrada é dizer que nem todo salvo é eleito, criando duas classes de crentes, uma de meros salvos e outra de salvos eleitos, sendo que aqueles, por fim, serão condenados [6]. Por implicação, a eleição de ninguém pode ser confirmada nesta vida, exceto na mente de Deus.

É quase desnecessário dizer que a Escritura desconhece completamente essa distinção. Em toda a Bíblia os eleitos serão levados à fé e serão salvos e os salvos são aqueles que foram eleitos. Existe completa identidade entre salvos e eleitos, a distinção é extrabíblica e artificial. Não existe nenhuma insinuação escriturística de que um crente possa ser um salvo não eleito. Pelo contrário, quando ela afirma a eleição de alguém, afirma sua salvação, e vice-versa. E a eleição pessoal não apenas pode ser confirmada em vida, como os crentes são instados a confirmarem-na pessoalmente.

Conclusão

Convém considerarmos, em conclusão, a necessidade dessas disjunções artificiais. Dissemos que o arminianismo é obrigado a essas divisões como artifício para fugir de declarações bíblicas e suas implicações lógicas. Para não ser acusado de universalismo ao rejeitar a redenção definida, é forçado a manter que as vontades do Pai e do Filho diferem entre si quanto aos objetos da eleição e da expiação. Frente à afirmação bíblica de que o Pai sempre ouve o Filho, que morre em favor de todos, é levado a afirmar que Jesus não intercede por todos aqueles por quem morre. E para poder continuar sustentando que alguém comprado pelo sangue de Jesus, regenerado pelo Espírito Santo e guardado pelo poder do Pai, ainda assim pode vir a perder a salvação, tem que introduzir a estranha afirmação de que todo eleito é salvo, mas nem todo salvo é eleito.

Tão mais simples e bíblico seria afirmar que Jesus morreu com o propósito de salvar infalivelmente a todos que o Pai elegeu e ninguém mais, os quais serão levados à fé pela obra do Espírito, os quais serão guardados até o fim pela Trindade Santa.

Notas

[1] “Deus decretou salvar e condenar certas pessoas em particular” (Armínio, Obras, vol. 1, p. 227)

[2] “Este decreto tem o seu embasamento na presciência de Deus, pela qual Ele sabe, desde toda a eternidade, que tais indivíduos, por meio de sua graça preventiva, creriam, e por sua graça subsequente perseverariam, de acordo com a administração previamente descrita dos meios que são adequados e apropriados para a conversão e a fé” (Armínio, Obras, vol. 1, p. 227).

[3] “O preço da morte de Cristo foi pago por todos e por cada um” (Armínio, Obras, vol. 1, p. 288)

[4] “Mas Cristo é descrito como intercedendo pelos fiéis, e excluindo o mundo, porque, depois que havia oferecido um sacrifício suficiente para remover os pecados de toda a humanidade, foi consagrado como ‘um grande sacerdote sobre a casa de Deus’ (Hb 10.21)” (Armínio, Obras, vol. 1, p. 43).

[5] "Dessa circunstância, podemos concluir, com a maior certeza, que as orações dEle nunca serão rejeitadas" (Armínio, Obras, vol. 1, p. 43).

[6] “Os cristãos fiéis e os eleitos não são corretamente interpretados como sendo as mesmas pessoas.” (Armínio, Obras, vol. 1, p. 350). Convém considerar, porém, que mais tarde, Armínio parece defender que “a fé é peculiar ao eleito” (idem, p.255), embora arminianos modernos mantenham a distinção.

A santificação da igreja

A santificação é uma característica fundamental da igreja, “sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hebreus 12.14). Contudo, nem sempre é bem compreendida e muitas vezes negligenciada. Muitas vezes é reduzida ao aspecto exterior, como se pudesse ser forçada de fora para dentro, através de regras que proíbem certos alimentos e prescrevem em detalhes o modo de se vestir. Mas isso produz mais sepulcros caiados que santos.

Outra confusão comum é não distinguir os conceitos de justificação e santificação. A igreja romana é culpada disso e essa confusão estava no centro da controvérsia nos dias da Reforma. A justificação é um ato exclusivo de Deus pelo qual Ele declara que aquele que crê em Cristo é justo diante dele. A justificação é objetiva. A santificação, por sua vez, é uma obra que Deus realiza no crente, transformando-o contínua e progressivamente à imagem de Jesus Cristo. A santificação é, pois, subjetiva. A justificação marca o início do processo de santificação, o qual somente será concluída ao final da jornada cristã na terra.

Biblicamente, santificação significa separação e consagração de pessoas ou coisas para um propósito definido. No caso do povo de Deus, santificação é a separação do mundo para consagração ao serviço de Deus. “Ser-me-eis santos, porque eu, o SENHOR, sou santo e separei-vos dos povos, para serdes meus” (Levítico 20.26). Porque Deus é santo, isto é, infinitamente separado e exaltado de Sua criação, o caráter divino requer santidade daqueles que pertencem a Ele. “Pelo contrário, segundo é santo aquele que vos chamou, tornai-vos santos também vós mesmos em todo o vosso procedimento, porque escrito está: Sede santos, porque eu sou santo” (1Pedro 1.15–16)

Dissemos que a justificação é um ato exclusivo de Deus, para diferenciá-la da santificação, que embora seja uma obra divina, é realizada em cooperação com o homem. “Portanto, santificai-vos e sede santos, pois eu sou o SENHOR, vosso Deus. Guardai os meus estatutos e cumpri-os. Eu sou o SENHOR, que vos santifico” (Levítico 20.7–8). Deus assegura a santificação final, mas o crente é responsável por buscar a santidade, “advertindo a todo homem e ensinando a todo homem em toda a sabedoria, a fim de que apresentemos todo homem perfeito em Cristo; para isso é que eu também me afadigo, esforçando-me o mais possível, segundo a sua eficácia que opera eficientemente em mim” (Colossenses 1.28–29).

A citação bíblica em epígrafe afirma que Cristo santifica e purifica a sua igreja, “para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém santa e sem defeito” (Efésios 5.27), enfatizando o aspecto divino da santificação. “Sendo este mesmo o salvador do corpo” (Efésios 5:23), Ele santifica a igreja livrando-a do pecado. Na justificação, salva da culpa do pecado, na santificação, do domínio do pecado e na glorificação final, da presença do pecado. Dentre os meios que o Senhor usa para santificar a igreja, está a Palavra de Deus, “tendo-a purificado por meio da lavagem de água pela palavra” (Efésios 5.26). Em Sua oração sacerdotal pela igreja Ele pedia ao Pai: “Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade” (João 17.17).

Mas do lado humano da santificação também há o que ser feito para que haja crescimento em santidade. Começa com uma aceitação do senhorio de Jesus Cristo, “a igreja está sujeita a Cristo” (Efésios 5:24). Isso leva, por consequência, à obediência dos mandamentos: “Guardai os meus estatutos e cumpri-os. Eu sou o SENHOR, que vos santifico” (Levítico 20.8). E quando falhar na observância dos mandamentos divinos, confessar e pedir perdão a Deus, pois “Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (1João 1.9).

Na santificação, vemos expressas tanto a soberania de Deus como a responsabilidade do homem. Deus é soberano para santificar e é Ele quem, finalmente, produz santidade no crente. Porém este é responsável diante Dele pela obediência ao comando “Sede santos, porque eu sou santo” (1Pedro 1.16). Sendo Deus três vezes santo, justificada está a declaração inicial de que sem santidade, ninguém verá o Senhor.

Soli Deo Gloria

A Cadeia Inquebrável da Salvação

Salvação e cinco pontos remetem ao acróstico TULIP, conhecidos como os cinco pontos do calvinismo: total depravação, eleição incondicional, expiação limitada, graça irresistível e perseverança dos santos. Mas neste artigo gostaria de enfatizar outros cinco pontos, relacionados com a ordem de salvação, os quais são geralmente referidos como elos da cadeia inquebrável da salvação divina, que começando na eternidade passada, mergulha na história e continua na eternidade futura.

O texto que nos guiará é Romanos 8:29-30, citado na epígrafe. É importante, desde já, chamar atenção para alguns detalhes importantes sobre esse texto. O primeiro deles, é que os objetos das ações divinas nele mencionados são pessoas e não algo nelas ou delas. As reiteradas referências “aos que” prova tratar-se de pessoas e não de coisas, caso em que o apóstolo usaria “os que” para referir-se aos objetos. O segundo é que se trata de um grupo definido e fixo de pessoas. Novamente, a referência “aos que... também os” implica isso. Os mesmos “aos que” referidos na eternidade passada são os mesmos “aos que” referidos na história e são os mesmos “aos que” que entram na glória. Ninguém é excluído, nenhum é adicionado. Estes dois fatos devem ser levados em conta ao considerarmos os que se segue.

A expressão “de antemão conheceu” é tradução de uma única palavra: proegno. O prefixo pro- indica um conhecimento prévio e eterno e é traduzido por “de antemão” na expressão. Ele denota algo ocorrido na eternidade passada e não na história corrente. Por sua vez, egno é o modo indicativo ativo do verbo ginosko, em seu aspecto aoristo, que significa “conheceu”. Aplicado ao conhecimento divino, não é mera presciência ou previsão. Deus é onisciente, conhecendo num ato simples tudo o que há para ser conhecido, real ou possível. E sendo presciente, conhece todos os fatos desde sempre. Mas proginosko tem um significado mais profundo que o conhecimento exaustivo e infalível de todas as pessoas, coisas e eventos.

De fato, ginosko traz em si a ideia de conhecimento relacional ao invés de mera constatação antecipada de fatos. Quando Deus diz “povo que não conheci me serviu” (2Sm 22.44; Sl 18:43) e Cristo sentencia aos ímpios “nunca vos conheci” (Mt 7.23) não estão falando que não sabiam que eles existiam, mas declarando que não havia um conhecimento relacional. De igual modo, quando o Senhor declara “Eu te conheci no deserto” (Os 13.5), Jesus informa “conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem a mim” (Jo 10.14) e Paulo assegura “o Senhor conhece os que lhe pertencem” (2Tm 2.19) a ideia envolvida não é de mero conhecimento, mas de relacionamento íntimo. Aliás, os judeus usavam a palavra conhecer para se referir à relação sexual entre um homem e uma mulher: “contudo, não a conheceu, enquanto ela não deu à luz um filho, a quem pôs o nome de Jesus” (Mt 1.25).

Assim sendo, ser conhecido de antemão significa ser escolhido como objeto do amor redentivo de Deus desde a eternidade. O verbo conhecer tem o sentido bíblico de conhecer intimamente com amor (Jr 1:5; Os 13:5; Am 3:2; 1Co 8:3; Gl 4:9) e expressa a peculiar complacência de Deus para com os Seus. É importante salientar que o texto não informa nada como condição para esse pré-conhecimento eletivo, sejam fé, amor, obras ou obediência. É uma decisão livre e soberana, como indica seu uso em 1Pe 1:20, com referência a Jesus.

Muitos negam que esse pré-conhecimento tenha caráter eletivo, pois ele seria determinativo e eles insistem que a presciência é meramente constatativa. Entendem que “eleitos, segundo a presciência de Deus Pai” (1Pe 1.2) significa tão somente que Deus previu a fé deles e os elegeu por constatar que eles creriam Nele. Mas tanto aqui como em Paulo, não vemos a fé mencionada como objeto da presciência divina. Aliás, em lugar algum nas Escrituras fé, amor ou outra coisa qualquer é indicada como condição para a eleição. Os eleitos são conhecidos por Deus desde antes da fundação do mundo, para serem objetos do Seu amor e depositários da Sua graça salvadora, sem consideração de algo neles previsto que os diferenciasse dos demais.

Ao conhecimento eletivo de Deus segue-se logicamente a predestinação. Muitas vezes essa ordem é invertida e a predestinação é vista como tratando-se de eleição e reprovação, daí a expressão dupla predestinação, bastante comum. Porém, a ordem bíblica é eleição, seguida da predestinação dos eleitos. Biblicamente falando, a predestinação diz respeito unicamente aos eleitos, não havendo sentido bíblico falar em predestinação para a perdição. “Aos que de antemão conheceu, também os predestinou”.

O termo bíblico predestinou é tradução do verbo proorize, indicativo ativo de proorizo. O prefixo pro- tem o mesmo sentido apontado no seu uso em proegno, ou seja, indica uma ação realizada na eternidade. Portanto, não se pode distinguir uma ordem cronológica entre o conhecimento divino de Seus eleitos e a predestinação deles, embora uma ordem lógica tenha que ser admitida, com a eleição precedendo a predestinação, como mencionado. O verbo horizo carrega o sentido de destinar, determinar, ordenar, designar, estabelecer limites. Portanto, proorize significa predeterminar, decidir de antemão, destinar desde a eternidade.

A questão de quem são os predestinados é bastante clara e não admite controvérsia: são os que foram conhecidos de antemão. O ponto é a que eles foram predestinados, e o complemento esclarece que é “para serem conformes à imagem de seu Filho”. Em outro texto, o destino decidido por Deus para seus eleitos é “a adoção de filhos” (Ef 1:5). Isto de forma alguma nega que a predestinação tenha em vista a salvação, pois esta engloba tudo o que é dito nesta passagem, do conhecimento prévio à glorificação final. Podemos dizer, então, que a predestinação é a preordenação divina de todas as coisas visando conduzir seus eleitos à fé, à adoção de filhos e à progressiva conformação à imagem de Seu filho, a ser completada na glorificação final.

Se mais precisa ser dito sobre a predestinação, é destacar sua força, que vem do fato de que quem predestina é Deus, o Todo-Poderoso! Somos “predestinados segundo o propósito Daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade” (Ef 1:11). Sugerir que um predestinado pode vir a apostatar e finalmente se perder é insultar o conhecimento, a sabedoria e o poder do Senhor. É quebrar a cadeia inquebrável. Deus decidiu o destino glorioso dos crentes, nada, nem mesmo os próprios crentes podem alterar esse decreto divino.

Conforme vimos até aqui, os termos pré-conhecidos e predestinados indicam atos realizados na eternidade passada. Mas agora a cadeia de ouro desce para o tempo para indicar a realização do propósito divino, ou seja, a etapa em que os eleitos “são chamados segundo o seu propósito” (Rm 8.28). Assim, “aos que predestinou, a esses também chamou”. E como foi com os termos anteriormente tratados, aqui também requer-se uma compreensão do que seja essa chamada.

Chamar é utilizado tanto para se referir a um convite geral, externo e não eficaz, como a uma chamada pessoal, interna e eficaz. O desconhecimento desses dois aspectos do chamado leva muitos a confundirem-se quanto à sua eficácia. Quando Jesus disse que “muitos são chamados, mas poucos, escolhidos” (Mt 22.14) estabeleceu uma diferença no número dos que são chamados e dos que são eleitos, sendo aqueles em maior quantidade que estes. Claramente Ele não estava se referindo ao chamado interior, feito pelo Espírito Santo. Porém no texto que estamos considerando, todos os que foram predestinados na eternidade são eficazmente chamados no devido tempo. Aqui, o número de chamados coincide exatamente com o número dos eleitos. Isso porque, em Paulo, ekalese, forma verbal derivada de kaleo, chamar, é sempre eficaz quando feita por Deus (Rm 4:17; 9:7,11,24; 1Co 1:9; 7:17-24; Gl 1:6,15; 5:8,13; Ef 4:1,4; Cl 3:15; 1Ts 2:12; 4:7; 5:24; 2Ts 2:14; 1Tm 6:12; 2Tm 1:9).

Da confusão entre o chamamento exterior pelo evangelho e a chamada interior pelo Espírito Santo resulta a má compreensão e a consequente oposição à doutrina da graça irresistível. Sim, os homens sempre podem resistir, e de fato resistem, ao convite geral do evangelho, o qual é acompanhado de promessa, “muitos são chamados”. Mas nos eleitos desde a eternidade, a graça vence essa resistência, pela operação milagrosa do Espírito no coração deles, “mas poucos, escolhidos”. Se alguém crê, é porque foi predestinado a isso, “creram todos os que haviam sido destinados para a vida eterna” (At 13.48).

Dada a natureza caída do homem, em que todas as suas faculdades estão afetadas pelo pecado e o leva a se opor a Deus e a tudo o que Ele oferece, o crente deve ser imensamente grato a Deus por agir nele, tirando seu coração de pedra e dando-lhe um coração de carne, capaz de amá-lo e desejá-lo. E a certeza de que todos os que foram de antemão conhecidos e predestinados na eternidade serão irresistivelmente chamados em tempo oportuno, é um estímulo à evangelização, pois Deus chama seus eleitos à fé mediante a pregação do evangelho.

É maravilhoso considerar o que Deus fez até aqui. Elegeu, predestinou e atraiu para Si pecadores perdidos. Mas como pecadores, transgressores da santa Lei podem se aproximar dAquele que é Fogo Consumidor, sem serem fulminados? E olhando por outro ponto de vista, como pode um Deus três vezes santo e perfeitamente justo receber aqueles que até então viveram em completa rebelião contra Ele? Neste ponto temos que considerar a justificação, ou seja, “a manifestação da sua justiça no tempo presente, para Ele mesmo ser justo e o justificador daquele que tem fé em Jesus” (Rm 3.26).

Todos os homens são concebidos em pecado e tão logo nascem, começam a cometer seus próprios pecados, transgredindo a Lei. Isto os torna culpados diante de Deus, e dignos de morte, morte eterna. A justiça de Deus precisa ser satisfeita, um preço precisa ser pago. Por isso Jesus morreu na cruz, para pagar o preço, no lugar e em favor daqueles que foram de antemão conhecidos e predestinados e agora chamados. Os pecados do Seu povo foram colocados sobre Ele e o preço pago satisfez a justiça de Deus, possibilitando que Deus se tornasse justificador de pecadores sem deixar de ser justo. Ao aceitar como satisfatório o sacrifício de Seu Filho, Deus assegurou a justificação de todos aqueles por quem Jesus morreu, os quais em tempo oportuno se apropriarão dessa justiça mediante a fé, pela operação milagrosa do Espírito Santo.

Tão certo que alguém foi amorosamente conhecido por Deus na eternidade e então predestinado a ser chamado em tempo e de modo oportuno, assim é certo que será justificado. O termo edikaiose é um termo forense e significa o pronunciamento de um veredito sobre uma pessoa, de que ela atende plenamente os requerimentos da Lei de Deus. E o modo indicativo do verbo mostra que isso é realizado de uma vez por todas. Dessa forma, todos os que são chamados e creem em Cristo, são desde agora declarados inocentes no tribunal de Deus.

Paulo começa o parágrafo em análise com uma declaração de certeza. “Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito” (Rm 8.28). Nos dois versos seguintes ele dá as razões para essa confiança. “Porquanto” no original é uma partícula lógica que significa porque, justificando a certeza expressa no verso anterior. E a expressão “a esses também glorificou” é o arremate dessa certeza, evidenciado pela forma como o apóstolo utiliza o verbo doxazo.

A glorificação dos justificados é ainda futura, pois se dará na volta do Senhor, porém Paulo a expressa como já realizada, tal a sua certeza na glorificação dos que são chamados segundo o Seu propósito. Mais adiante ele dirá que Deus dá “a conhecer as riquezas da sua glória em vasos de misericórdia, que para glória preparou de antemão, os quais somos nós, a quem também chamou, não só dentre os judeus, mas também dentre os gentios” (Rm 9.23–24). Tudo o que acontece na vida do crente foi preordenado por Deus, visando o bem último daquele que foi chamado, quer dizer, a sua glorificação ou perfeita conformação à imagem do Filho!

Quando diz que os que amam a Deus foram predestinados “para serem conformes à imagem de seu Filho” (Rm 8:29) e para “a adoção de filhos” (Ef 1:5), o apóstolo tem em mente uma operação que é iniciada na conversão e que será completada na manifestação em glória do Senhor. “Amados, agora, somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que haveremos de ser. Sabemos que, quando Ele se manifestar, seremos semelhantes a Ele, porque haveremos de vê-lo como Ele é” (1Jo 3.2). Os que creem em Cristo podem, e devem, ter certeza de sua eleição na eternidade, de que agora são filhos de Deus, o que o Espírito lhes testemunha no coração e que finalmente serão feitos iguais a Jesus. “Estou plenamente certo de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao Dia de Cristo Jesus” (Fp 1.6). Aleluia!

Com Rm 8:29-30 o apóstolo pretende eliminar qualquer dúvida dos que amam a Deus de que eles são objetos dos cuidados do Senhor, pois foram “predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade” (Ef 1.11). Esse propósito divino não começa com a conversão deles, nem mesmo no nascimento ou concepção. Na eternidade passada eles já eram conhecidos por Deus e objetos de Seu amor. Eles podem crer que Deus “em amor nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade” (Ef 1.4–5), muito antes do mundo existir.

O tempo não suspende este cuidado meticuloso de Deus para com seus eleitos. Eles são chamados e justificados e enquanto peregrinam neste mundo “todas as coisas cooperam para o bem” (Rm 8:28) deles, portanto o apóstolo podia dizer “estou bem certo de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as coisas do presente, nem do porvir, nem os poderes, nem a altura, nem a profundidade, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor.” (Rm 8.38–39). Todos os aspectos de sua vida estão sob a amorosa providência de Deus, e mesmo os males redunda no bem deles.

Assim, não deve causar surpresa a certeza inexorável com que Paulo afirma que eles entrarão indubitavelmente na glória do Senhor. Esta certeza todos os que foram justificados ao crerem em Jesus devem ter. “Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo; por intermédio de quem obtivemos igualmente acesso, pela fé, a esta graça na qual estamos firmes; e gloriamo-nos na esperança da glória de Deus.” (Rm 5.1–2). Os sofrimentos dessa vida, que afinal são para o bem deles, não tiram essa certeza. “Porque para mim tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente não podem ser comparados com a glória a ser revelada em nós” (Rm 8.18).

Diante disso tudo, o que nos resta? Nada, além de irrompermos em louvor a Ele: “Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos tem abençoado com toda sorte de bênção espiritual nas regiões celestiais em Cristo” (Ef 1.3)!

Soli Deo Gloria

O problema de Mateus 11:12

A salvação é pela graça ou depende do esforço pessoal? Boa parte dos cristãos responderiam com um enfático "Sola Gratia!". Alguns, porém, diriam que é pela graça cooperando com esforço humano. E ainda alguns poucos afirmariam que depende fundamentalmente do empenho pessoal. Nestes dois últimos casos, pode-se buscar apoio em Mateus 11:12 onde Jesus diz que “desde os dias de João Batista até agora, o reino dos céus é tomado por esforço, e os que se esforçam se apoderam dele” (Mt 11.12). Entretanto, este texto é de difícil tradução e representa um desafio considerável de interpretação.

Algumas traduções existentes em português dizem que "o reino dos céus é tomado à força" (NVI, 2000; TB, 2010), que "o reino dos céus é tomado por esforço" (ARA, 1993), que "se faz violência ao Reino dos céus" (ARC, 1968; ARC, 1969; ARC, 1995), que "o reino dos céus tem sido assaltado com violência" (APC, 1991) e que "o Reino do Céu tem sido atacado com violência" (NTLH, 2000). Sobre a identidade dos que tomam o reino é dito que são “os que usam de força” (NVI, 2000), "os que se esforçam" (ARA, 1993; TB, 2010) ou ainda "os violentos" (APC, 1991; NTLH, 2000). Há boas razões para se optar por uma ou outra tradução, mas obviamente não podem todas estar igualmente corretas.

O termo traduzido para a expressão "tomado por esforço” e suas alternativas é biazetai, derivado de biazo, que significa "usar a violência, aplicar a força; forçar, infligir violência em". O termo só ocorre aqui e em Lc 16:16, mas cognatos de biazetai são usados na Septuaginta. Exatamente na mesma forma encontrada em Mt 11:12, o verbo só ocorre no apócrifo 4Macabeus 2.8, com o significado de “aprisionar, tornar subserviente, dominar, forçar, violentar, subjugar, dominar, pisar”. O verbo está na voz passiva. A expressão “os que se esforçam” é tradução de biastai, substantivo que significa “forte, impetuoso, que faz uso da força, violento”, “o que emprega a violência, pessoa impetuosa” ou “uma pessoa que apela para a violência para alcançar os seus objetivos”.

Uma questão que surge na análise de biazetai e biastai é se são usados de uma forma favorável ou desfavorável, ou seja, se denotam algo bom ou mau. Como vimos, biazetai está na voz passiva, o que significa literalmente que o reino “é forçado, vencido, superado, tomado pela tormenta”. A voz passiva de biazo só ocorre no sentido de uma subjugação hostil ou violenta, portanto, mau. No grego extra-bíblico biastes ocorre em Filo sempre num mau sentido. Uma vez que o termo biazetai na voz passiva implica o uso de força e até mesmo de violência, o sentido de que o reino sofre violência de natureza desfavorável parece-nos a mais provável.

Isto tudo considerado, entendemos que a leitura mais natural do texto é a que diz que desde o tempo de João o reino de Deus e seus trabalhadores sofrem violência da parte de seus inimigos, que tentam evitar ou usurpar o governo divino. O grego indica que o reino está sendo atacado e que homens violentos estão tratando de impedir que outros entrem. A prisão de João e a rejeição e execução de Jesus a acontecer logo em seguida corroboram essa interpretação. Sendo assim, os biastai (violentos) são os líderes religiosos dos dias de Jesus, que reclamavam por conta próprio um direito sobre o reino ou os grupos revolucionários que pretendiam um reino terreno, como os zelotes e outros ativistas, mas não os discípulos de Jesus. Herodes pode ser incluído nessa lista pois prendeu e iria executar João.

O contexto parece reforçar a ideia de que o reino é atacado por inimigos e que seus súditos são perseguidos. No capítulo anterior, quando Jesus enviou os doze dizendo “pregai, dizendo: É chegado o reino dos céus” (Mt 10:7) avisou “eis que vos envio como ovelhas ao meio de lobos” (Mt 10:16) e acrescentou “acautelai-vos, porém, dos homens; porque eles vos entregarão aos sinédrios, e vos açoitarão nas suas sinagogas...” (Mt 10:17) “e odiados de todos sereis por causa do meu nome” (Mt 10:22). No capítulo 12 a perseguição anunciada no capítulo 10 e implícita no capítulo 11, começa a tornar-se explícita: “E os fariseus, vendo isto, disseram-lhe: Eis que os teus discípulos fazem o que não é lícito fazer num sábado” (Mt 12:2) e “os fariseus, tendo saído, formaram conselho contra ele, para o matarem” (Mt 12:14).

Os violentos, então, não seriam discípulos determinados, mas inimigos que tentam arrebatar o reino pela força, não entrando e tentando impedir que outros tomem parte dele. Os discípulos de Jesus são descritos no mesmo capítulo, não como homens violentos ou valentes, mas sim como pequeninos e oprimidos: “Naquele tempo, respondendo Jesus, disse: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que ocultaste estas coisas aos sábios e entendidos, e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim te aprouve. Todas as coisas me foram entregues por meu Pai, e ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (Mt 11:25-27).

Se esta interpretação estiver correta, o uso de Mt 11:12 para defender o esforço humano na obtenção da salvação é impróprio. Aliás, advogar a interpretação de que o reino de Deus é conquistado por pessoas esforçadas levanta sérios problemas com o ensino claro e inequívoco de que salvação é unicamente pela graça e pelo poder de Deus.

Soli Deo Gloria

Nota: está é uma versão condensada e adaptada de um artigo mais completo, com as fontes consultadas, que pode ser obtido aqui: O problema de Mateus 11:12.

Igreja visível e invisível ou quem será salvo?

61. Serão salvos todos os que ouvem o Evangelho e pertencem à Igreja? 

Nem todos os que ouvem o Evangelho e pertencem à Igreja visível serão salvos, mas unicamente aqueles que são membros verdadeiros da Igreja invisível. 

Rm 9:6; Mt 7:21. 

62. Que é a Igreja visível? 

A Igreja visível é uma sociedade composta de todos quantos, em todos os tempos e lugares do mundo, professam a verdadeira religião, juntamente com seus filhos. 

1Co 1:2; Gn 17:7; At 2:39; 1Co 7:14. 

63. Quais são os privilégios da Igreja visível? 

A Igreja visível tem o privilégio de estar sob o cuidado e governo especial de Deus; de ser protegida e preservada em todos os tempos, não obstante a oposição de todos os inimigos; e de gozar da comunhão dos santos, dos meios ordinários de salvação e das ofertas da graça por Cristo a todos os membros dela, no ministério do Evangelho, testificando que todo o que crer nEle será salvo, não excluindo a ninguém que queira vir a Ele. 

Is 4:5-6; Mt 16:18; At 2:42; Sl 147:19-20; Ef 4:11-12; Rm 8:9; Jo 6:37. 

64. Que é a Igreja invisível? 

A Igreja invisível é o número completo dos eleitos, que têm sido e que hão de ser reunidos em um corpo sob Cristo, a cabeça. 

Ef 1:10; 22-23; Jo 11:52; 10:16. 

65. Quais são os benefícios especiais de que gozam por Cristo os membros da Igreja invisível? 

Os membros da igreja invisível gozam por Cristo da união e comunhão com Ele em graça e gloria. 

Jo 17:21,24; 1Jo 1:3.

Catecismo Maior de Westminster
Semana 18

Os benefícios da Mediação de Cristo

57. Quais são os benefícios que Cristo adquiriu pela sua mediação? 

Cristo, pela sua mediação, adquiriu a redenção, juntamente com todos os mais benefícios do pacto da graça. 

Hb 9:12; 1Co 1:20. 

58. Como nos tornamos participantes dos benefícios que Cristo adquiriu? 

Tornamo-nos participantes dos benefícios que Cristo adquiriu, pela aplicação deles, a nós, que é especialmente a obra do Espírito Santo. 

Jo 1:12; Tt 3:5-6; Jo 16:14-15. 

59. Quem são feitos participantes da redenção mediante Cristo? 

A redenção é aplicada e eficazmente comunicada a todos aqueles para quem Cristo a adquiriu, os quais são nesta vida habilitados pelo Espírito Santo a crer em Cristo conforme o Evangelho. 

Jo 6:37,39; 10:15-16; Ef 2:8; Jo 3:5. 

60. Poderão ser salvos por viver segundo a luz da natureza aqueles que nunca ouviram o Evangelho e por conseguinte não conhecem a Jesus Cristo, nem nEle creem? 

Aqueles que nunca ouviram o Evangelho e não conhecem a Jesus Cristo, nem nEle creem, não poderão se salvar, por mais diligentes que sejam em conformar as suas vidas à luz da natureza, ou às leis da religião que professam; nem há salvação em nenhum outro, senão em Cristo, que é o único Salvador do seu corpo, a Igreja. 

Rm 10:14; 2Ts 1:8-9; Ef 2:12: Jo 3:18; 8:24; 1Co 1:21; Rm 3:20; 2:14-15; Jo 4:22: At 4:12; Ef 5:23. 

Catecismo Maior de Westminster
Semana 17

Presciência pervertida

A. W. Pink
Que controvérsias têm sido engendradas por este assunto no passado! Mas que verdade das Escrituras Sagradas existe que não se tenha tornado em ocasião para batalhas teológicas e eclesiásticas? A deidade de Cristo, Seu nascimento virginal, Sua morte expiatória, Seu segundo advento; a justificação do crente, sua santificação, sua segurança; a Igreja, sua organização, oficiais e disciplina; o batismo, a ceia do Senhor, e uma porção doutras preciosas verdades que poderiam ser mencionadas. Contudo, as controvérsias sustentadas não fecharam a boca dos fiéis servos de Deus; então, por que deveríamos evitar a disputada questão da presciência de Deus porque, com efeito, há alguns que nos acusarão de fomentar contendas? Que outros se envolvam em contendas, se quiserem; nosso dever é dar testemunho segundo a luz a nós concedida.

Há duas coisas referentes à presciência de Deus que muitos ignoram: o significado do termo e o seu escopo bíblico. Visto que esta ignorância é tão amplamente generalizada, é fácil aos prega dores e mestres impingir perversões deste assunto, até mesmo ao povo de Deus. Só há uma salvaguarda contra o erro: estar firme na fé. Para isso, é preciso fazer devoto e diligente estudo, e receber com singeleza a Palavra de Deus infundida. Só então ficamos fortalecidos contra as investidas dos que nos atacam. Hoje em dia existem os que fazem mau uso desta verdade, com o fim de desacreditar e negar a absoluta soberania de Deus na salvação dos pecadores. Assim como os seguidores da alta crítica repudiam a divina inspiração das Escrituras e os evolucionistas a obra de Deus na criação, alguns mestres pseudo-bíblicos andam pervertendo a presciência de Deus com o fim de pôr de lado a Sua incondicional eleição para a vida eterna.

Quando se expõe o solene e bendito tema da pré-ordenação divina, e o da eterna escolha feita por Deus de algumas pessoas para serem amoldadas à imagem do Seu Filho, o diabo envia alguém para argumentar que a eleição se baseia na presciência de Deus, e esta "presciência" é interpretada no sentido de que Deus previu que alguns seriam mais dóceis que outros, que responderiam mais prontamente aos esforços do Espírito e que, visto que Deus sabia que eles creriam, por conseguinte, predestinou-os para a salvação. Mas tal declaração é radicalmente errônea. Repudia a verdade da depravação total, pois defende que há algo bom em alguns homens. Tira a independência de Deus, pois faz com que seus decretos se apóiem naquilo que Ele descobre na criatura. Vira completamente ao avesso as coisas, porquanto ao dizer que Deus previu que certos pecadores creriam em Cristo e, por isso, predestinou-os para a salvação, é o inverso da verdade. As Escrituras afirmam que Deus, em Sua soberania, escolheu alguns para serem recipientes de Seus distinguidos favores (Atos 13:48) e portanto, determinou conferir-lhes o dom da fé. A falsa teologia faz do conhecimento prévio que Deus tem da nossa fé a causa da eleição para a salvação, ao passo que a eleição de Deus é a causa, e a nossa fé em Cristo, o efeito.

A. W. Pink
In: Os Atributos de Deus

A Pessoa do Mediador e nossa salvação

37. Sendo Cristo o Filho de Deus, como se fez homem? 

Cristo, o Filho de Deus, fez-se homem tomando para si um verdadeiro corpo e uma alma racional sendo concebido pelo poder do Espírito Santo no ventre da Virgem Maria, da sua substância e nascido dela, mas sem pecado. 

Jo 1:14; Mt 26:38; Lc 1:31,35-42; Hb 4:15; 7:26. 

38. Qual a necessidade de o Mediador ser Deus? 

Era necessário que o Mediador fosse Deus para poder sustentar a natureza humana e guardá-la de cair debaixo da ira infinita de Deus e do poder da morte; para dar valor e eficácia aos seus sofrimentos, obediência e intercessão; e para satisfazer a justiça de Deus, conseguir o seu favor, adquirir um povo peculiar, dar a este povo o seu Espírito, vencer todos os seus inimigos e conduzi-lo à salvação eterna. 

At 2:24; Rm 1:4; At 20:28; Hb 7:25; Rm 3:24-26; Ef 1:6; Tt 2:14; Jo 15:26; Lc 1:69,71,74; Hb 5:9. 

39. Qual a necessidade de o Mediador ser homem? 

Era necessário que o Mediador fosse homem para poder levantar a nossa natureza e obedecer à lei, sofrer e interceder por nós em nossa natureza, e simpatizar com as nossas enfermidades; para que recebêssemos a adoção de filhos, e tivéssemos conforto e acesso com confiança ao trono da graça. 

Rm 8:34; Mt 5:17; Gl 4:4, Rm 5:19; Hb 2:4; 7:24-25; 4:15-16; Gl 4:5 

40. Qual a necessidade de o Mediador ser Deus e homem em uma só pessoa? 

Era necessário que o Mediador, que havia de reconciliar o homem com Deus, fosse Deus e homem e isto em uma só pessoa, para que as obras próprias de cada natureza fossem aceitas por Deus a nosso favor e que nós confiássemos nelas como as obras da pessoa inteira. 

Mt 1:21,23; 3:17; 1Pe 2:6.

Catecismo Maior de Westminster
Semana 12

O Pacto da Graça no Novo e no Antigo Testamento

33. Foi o pacto da graça sempre administrado de uma só maneira?

O pacto da graça não foi administrado da mesma maneira; mas as suas administrações no Velho Testamento eram diferentes das debaixo do Novo.

1Co 3:6-9; Hb 8:7-13. 

34. Como foi administrado o pacto da graça no Velho Testamento? 

O pacto da graça foi administrado no Velho Testamento por promessas, profecias, sacrifícios, pela circuncisão, pela páscoa e por outros símbolos e ordenanças: todos os quais tipificaram o Cristo, que havia de vir e eram naquele tempo suficientes para edificar os eleitos na fé do Messias prometido, por quem tiveram, ainda nesse tempo, a plena remissão do pecado e a salvação eterna. 

Rm 15:8; At 3:24; Hb 10:1; Rm 4:11; 1Co 5:7; Hb 11:13; Gl 3:7-9,14. 

35. Como é o pacto da graça administrado no Novo Testamento? 

No Novo Testamento, quando Cristo, a substância, foi manifestado, o mesmo pacto da graça foi e continua a ser administrado na pregação da palavra na celebração dos sacramentos do batismo e da Ceia do Senhor; e assim a graça e a salvação são manifestadas em maior plenitude, evidência e eficácia a todas as nações. 
Lc 24:47-48; Mt 28:19-20; 1Co 11:23-25; Rm 1:16; 2Co 3:6. 

36. Quem é o Mediador do pacto da graça? 

O único Mediador do pacto da graça é o Senhor Jesus Cristo, que, sendo o eterno Filho de Deus, da mesma substância e igual ao Pai, no cumprimento do tempo fêz-se homem, e assim foi e continua a ser Deus e homem em duas naturezas perfeitas e distintas e uma só pessoa para sempre. 

Jo 14:16; 1Tm 2:5; Jo 1:1; 10:30; Fl 2:6; Gl 4:4; Lc 1:35; Rm 9:5; Cl 2:9; Hb 13:8.

Catecismo Maior de Westminster
Semana 11

O Pacto da Graça

30. Deixa Deus todo o gênero humano perecer no estado de pecado e miséria?

Deus não deixa todos os homens perecer no estado de pecado e miséria, em que caíram pela violação do primeiro pacto comumente chamado o pacto das obras; mas, por puro amor e misericórdia livra os escolhidos desse estado e os introduz num estado de salvação pelo segundo pacto comumente chamado o pacto da graça.

1Ts 5:9; Gl 3:10; Tt 3:4-7; 1:2.

31. Com quem foi feito o pacto da graça?

O pacto da graça foi feito com Cristo, como o segundo Adão, e nEle, com todos os eleitos, como sua semente.

Gl 3:16; Is 53:10-11; 59:21. 

32. Como é manifestada a graça de Deus no segundo pacto?

A graça de Deus é manifestada no segundo pacto em Ele livremente prover e oferecer aos pecadores um Mediador e a vida e a salvação por Ele; exigindo a fé como condição de interessá-los nEle, promete e dá o Espírito Santo a todos os seus eleitos, para neles operar essa fé, com todas as mais graças salvadoras, e para os habilitar a praticar toda a santa obediência, como evidência da sinceridade da sua fé e gratidão para com Deus e como o caminho que Deus lhes designou para a salvação.

Gn 3:15; Is 4:3-6; Jo 3:26; 6:27; Tt 2:5; 1Jo 5:11-12; Jo 3:36; 1:2; Pv 1:23; Lc 11:13; 1Co 12:3,9; Gl 5:22-23; Ez 34:27; Tg 2:18,12; 2Co 5:14-15; Ef. 2:10.

Catecismo Maior de Westminster
Semana 10

Jesus Cristo é o único caminho para Deus?

Ao responder a esta pergunta, é extremamente importante esvaziá-la de qualquer conteúdo emocional explosivo em potencial. Quando o cristão assevera que Cristo é o único caminho para Deus, e que fora d’Ele não há salvação, não está sugerindo que imagina que é pessoalmente melhor do que outras pessoas, ou que os cristãos em geral assim pensam.

Algumas pessoas erroneamente imaginam que os cristãos formaram um clube de preconceitos, como uma fraternidade com uma cláusula de segregação racial. Tais pessoas pensam que se a fraternidade e os cristãos tivessem menos preconceitos, votariam para mudar as regras da membresia, e, no caso dos cristãos, admitir qualquer que crê em Deus. “Por que introduzir Jesus Cristo dentro do problema?” é a pergunta que frequentemente ouvimos. “Por que não podemos concordar simplesmente na existência de Deus?” E isto nos leva à questão fundamental.

Os cristãos declaram que Jesus Cristo é o único caminho para Deus por que a Escritura diz, “Abaixo do céu não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos” (Atos 4.12). Os cristãos creem assim, não por causa de ter feito esta regra por conta deles, mas porque Jesus Cristo assim ensinava, (João 14.6). O cristão não permaneceria fiel ao seu Senhor se afirmasse outra coisa. Tem que se confrontar com o problema da verdade. Se Jesus Cristo é Quem reivindica ser, então possuímos a própria palavra autoritativa de Deus quanto a este assunto. Se é Deus, e se não há outro Salvador, então, obviamente, é o único caminho para Deus.

Os cristãos não poderiam mudar este fato, nem por um voto seu, nem por outra maneira.

Paul E. Litlle
In: Você pode explicar sua fé?

Um crente pode apostatar?

Nós podemos viver em uma cultura a qual crê que todos serão salvos, que nós somos “justificados pela morte” e que tudo de que você precisa para ir para o céu é morrer, mas a Palavra de Deus certamente não dos dá o luxo de crer nisso. Qualquer leitura rápida e honesta do Novo Testamento mostra que os apóstolos estavam convencidos de que ninguém pode ir para o céu a menos que creia somente em Cristo para a sua salvação (João 14.6; Romanos 10.9-10).

Historicamente, os cristãos evangélicos têm largamente concordado sobre esse ponto. Onde eles diferem tem sido na questão da segurança da salvação. Pessoas que concordariam que apenas aqueles que confiam em Jesus serão salvos têm, por outro lado, discordado acerca de se alguém que verdadeiramente crê em Cristo pode perder a sua salvação.

Teologicamente falando, o que estamos discutindo aqui é o conceito de apostasia. Esse termo vem de uma palavra grega que significa “estar longe de”. Quando falamos sobre aqueles que se tornaram apóstatas ou que cometeram apostasia, estamos falando daqueles que caíram da fé ou, no mínimo, da profissão de fé em Cristo que eles um dia fizeram.

Muitos crentes têm sustentado que, sim, verdadeiros cristãos podem perder a sua salvação porque há vários textos no Novo Testamento que parecem indicar que isso possa acontecer. Estou pensando, por exemplo, nas palavras de Paulo em 1Timóteo 1.18-20:

Este é o dever de que te encarrego, ó filho Timóteo, segundo as profecias de que antecipadamente foste objeto: combate, firmado nelas, o bom combate, mantendo fé e boa consciência, porquanto alguns, tendo rejeitado a boa consciência, vieram a naufragar na fé. E dentre esses se contam Himeneu e Alexandre, os quais entreguei a Satanás, para serem castigados, a fim de não mais blasfemarem.

Aqui, em meio a instruções e admoestações relativas à vida e ao ministério de Timóteo, Paulo alerta Timóteo a manter a fé e uma boa consciência, e lembrar-se daqueles que não o fizeram. O apóstolo se refere àqueles que “vieram a naufragar na fé”, homens que ele havia entregado a Satanás, “para que aprendam a não blasfemar” (ARC). O segundo ponto é uma referência à excomunhão daqueles homens por Paulo, e a passagem inteira combina uma sóbria advertência com exemplos concretos daqueles que gravemente decaíram de sua profissão cristã.

Não há dúvida de que cristãos professos podem cair, e caem radicalmente. Pensemos em homens como Pedro, por exemplo, que negou a Cristo. Mas o fato de que ele foi restaurado mostra que nem todo crente professo que cai ultrapassou o ponto em que não é mais possível retornar. Nesse particular, nós devemos distinguir uma queda séria e radical de uma queda total e definitiva. Os teólogos reformados têm notado que a Bíblia está cheia de exemplos de verdadeiros crentes que caem em pecados graves e, até mesmo, em períodos prolongados de impenitência. Então, cristãos de fato caem, e caem radicalmente. O que poderia ser mais sério do que a negação pública de Jesus Cristo por Pedro?

Mas a pergunta é: acaso essas pessoas culpadas de uma verdadeira queda são irremediavelmente caídas e eternamente perdidas, ou essa queda é uma condição temporária que irá, em última análise, ser remediada pela sua restauração? No caso de um indivíduo como Pedro, nós vemos que a sua queda foi remediada pelo seu arrependimento. Contudo, o que dizer daqueles que decaem de modo definitivo? Acaso eles foram algum dia crentes verdadeiros?

Nossa resposta a essa pergunta deve ser não. 1João 2.19 fala dos falsos mestres que haviam saído da igreja como nunca tendo sido verdadeiramente parte da igreja. João descreve a apostasia de pessoas que haviam feito uma profissão de fé, mas nunca haviam sido de fato convertidas. Além disso, nós sabemos que Deus glorifica todos aqueles a quem ele justifica (Romanos 8.29-30). Se uma pessoa tem uma verdadeira fé salvadora e é justificada, Deus irá preservar aquela pessoa.

Nesse ínterim, contudo, se o indivíduo que caiu ainda está vivo, como nós sabemos se ele é um completo apóstata? Uma coisa que nenhum de nós pode fazer é ler o coração de outras pessoas. Quando vejo um indivíduo que fez uma profissão de fé e depois a rejeita, eu não sei se ele é alguém verdadeiramente regenerado que está no meio de uma queda séria e radical, mas que em algum ponto no futuro certamente será restaurado; ou se ele é alguém que nunca foi de fato convertido, cuja profissão de fé era falsa desde o começo.

Essa questão sobre se uma pessoa pode perder a sua salvação não é uma questão abstrata. Ela nos afeta bem no âmago de nossa vida cristã, não apenas no que concerne a nossas preocupações com nossa própria perseverança, mas também com a de nossos familiares e amigos, especialmente aqueles que pareciam, por todas as evidências externas, ter feito uma profissão de fé genuína. Nós pensávamos que a profissão deles era crível, nós os abraçamos como irmãos ou irmãs, apenas para descobrirmos que eles rejeitariam aquela fé.

O que você faz, na prática, em uma situação como aquela? Primeiro, você ora e, então, você espera. Nós não sabemos o resultado final da situação, e tenho certeza de que haverá surpresas quando chegarmos ao céu. Ficaremos surpresos em ver pessoas as quais achamos que não estariam lá, e ficaremos surpresos em não ver pessoas as quais tínhamos certeza de que estariam lá, porque nós simplesmente não sabemos a condição interior de um coração humano ou de uma alma humana. Apenas Deus pode ver essa alma, transformar essa alma e preservar essa alma.

R. C. Sproul
In: Um crente pode apostatar?

O Arminianismo Wesleyano

Charles Hodge
O sistema arminiano foi modificado tão profundamente por Wesley e seus partidários e seguidores, que lhe dão a designação de arminianismo evangélico, e reivindicam para ele originalidade e globalidade. Difere do sistema dos remonstrantes:

Ao admitir que, desde a Queda, o homem se acha em um estado de absoluta ou total contaminação e depravação. O pecado original não é mera deterioração de nossa natureza, mas a total depravação moral.

Ao negar que os homens, neste estado da natureza, tenham algum poder para cooperar com a graça de Deus. Os defensores deste sistema consideram a doutrina da capacidade natural, ou da capacidade do homem natural para cooperar com Deus, como semipelagiana, e a doutrina de que os homens tenham por natureza a capacidade de guardar com perfeição os mandamentos de Deus, como pelagianismo puro.

Ao afirmar que a culpa que recai sobre todos os homens pelo pecado de Adão é removida pela justificação que veio a todos os homens pela justiça de Cristo.

Que a capacidade do homem de poder jamais cooperar com o Espírito de Deus não se deve a nada inerente em seu estado natural caído, mas à influência universal da redenção de Cristo. Portanto, cada recém-nascido chega ao mundo livre da condenação com base na justiça de Cristo, e com uma semente da graça divina ou o princípio de uma nova vida implantada no coração. "É indubitável que, pelo delito de um", afirma Wesley, "veio o juízo sobre todos os homens (todos que nascem no mundo) para condenação, e isso afeta a cada criancinha da mesma forma que a cada pessoa adulta. Mas é igualmente verdade que, pela justiça de um, veio sobre todos os homens o dom gratuito (ou seja, para todos os nascidos no mundo, tanto criancinhas quanto adultos) para justificação." E Fletcher declara: "Como Adão trouxe condenação universal e uma semente de morte sobre todas as criancinhas, assim Cristo traz sobre elas uma justificação geral e uma semente universal de vida." "Cada ser humano", diz Warren, "tem uma medida de graça (a não ser que a tenha rejeitado), e os que empregam fielmente este dom da graça serão aceitos por Deus no dia do juízo, sejam eles judeus ou gregos, cristãos ou pagãos. Em virtude da mediação de Jesus Cristo entre Deus e nossa raça apostatada, todos os homens, desde a promessa de Gênesis 3.15, estão sob a economia da graça,e a única diferença entre eles como sujeitos ao governo moral de Deus é que, enquanto todos têm graça e luz suficientes para alcançar a salvação, alguns, sobre e acima disso, têm mais e outros menos." Wesley diz: "Nenhuma pessoa vivente deixa de ter algo da graça preveniente, e cada grau é um grau de vida." E em outro lugar: "Digo que há uma medida de liberdade supernaturalmente restaurada para cada pessoa, juntamente com aquela luz sobrenatural que alumia cada pessoa que vive neste mundo."

Segundo esta visão do plano de Deus, ele decretou ou propôs: (1) Permitir a Queda do homem. (2) Enviar seu Filho para que fizesse plena satisfação pelos pecados de todo o mundo. (3) Com base nesta satisfação, redimir a culpa da primeira transgressão de Adão e do pecado original, e comunicar tal quantidade de graça e luz a todos e a cada um dos homens a ponto de permitir a todos alcançar a vida eterna. (4.) Os que devidamente melhoram aquela graça e perseverança até o fim, são ordenados para a salvação; Deus se propõe, desde a eternidade, salvar àqueles que ele previu perseverar assim na fé e na santidade.

É evidente que o principal ponto de diferença entre os esquemas luteranos mais recentes, arminianos e wesleyanos, e o dos agostinianos consiste que, segundo este último, é Deus, e segundo os outros é o homem, quem determina aqueles que hão de ser salvos. Agostinho ensinou que, da família caída dos homens, todos poderiam ser deixados, com justiça, a perecer em sua apostasia; Deus, porém, meramente por seu beneplácito, elegeu alguns para a vida eterna, enviou seu Filho para a redenção desses, e lhes dá o Espírito Santo para garantir seu arrependimento, fé e santidade até o fim. "Cur autem non omnibus detur [donum fidei], fidelem movere non debet, qui credit ex uno omnes iss in condemnationem, sine dúbio justissimam: ita ut nulla Dei esset justa reprehensio, etiamsi nullus inde liberaritur. Unde constat, magnam esse gratiam, quod plurimi liberantur."

Portanto, é Deus, e não o homem que decide quem há de ser salvo. Ainda que se possa dizer que esta é a questão crucial entre estes grandes sistemas, os quais têm dividido a Igreja em todas as épocas, não obstante a questão envolve necessariamente todas as outras diferenças, como a natureza do pecado original; o motivo de Deus providenciar a redenção; a natureza e o desígnio da obra de Cristo; e a natureza da graça divina, ou a obra do Espírito Santo. E assim, em grande medida, todo o sistema teológico, e necessariamente o caráter de nossa religião, depende da postura que se adote ante esta questão concreta. Portanto, trata-se de um tema de maior relevância prática, e não de um assunto de especulação ociosa.

Charles Hodge
In: Teologia Sistemática

O propósito de Deus fica firme mediante a eleição

Permitam-me então fazer um sumário do que o apóstolo diz nestes importantes versículos.

Primeiro, a promessa e o propósito de Deus só dizem respeito a algumas pessoas. Essa afirmação é tão verdadeira quanto à nação de Israel quanto todas as demais pessoas. Esse é tão somente outro modo de dizer:"nem todos os de Israel são Israel" - contrariamente fatal e errônea presunção dos judeus. Em última instância, foi essa a razão pela qual eles crucificaram o próprio Filho de Deus. Não se deram conta disso. A promessa de Deus não é universal, nem mesmo com relação à Israel, aos judeus. É só para certas pessoas.

Segundo, estas pessoas, às quais o propósito e a promessa de Deus se aplicam, são, e vieram a ser o que são, não por causa de alguma coisas delas ou nelas. Elas são o povo de Deus, são esta "semente" da qual Paulo fala, não por causa do nascimento deles, não por causa da sua nacionaliade, não por causa de algumas coisas que elas tenham feito ou façam, nem mesmo por crerem no evangelho. São o que são porque Deus as chama a ser, as chama à existência, por causa do elemento sobrenatural presente em seu nascimento, como já vimos no caso de Isaque, que, como Paulo nos diz em Gálatas 4:28-30, nasceu "segundo o Espírito".

Terceiro, noutras palavras, o propósito de Deus está sendo levado a efeito, sempre foi e sempre será, por meio desse processo de seleção e eleição, e vemos como Paulo demonstra esta verdade mediante os casos de Ismael e Isaque como de Esaú e Jacó.

Quarto, Deus põe em andamento e efetua o Seu propósito por intermédio deste processo de seleção e eleição unicamente por uma razão - porque é o único método que garante que Seu propósito e o Seu plano serão certa, segura e infalivelmente efetuados e levados a uma fruição final: "para que o propósito de Deus, segundo a eleição, ficasse firme". Não depende de nós de forma alguma, e sim do próprio Deus, do Seu caráter e de Sua ação.

Martin Lloyd-Jones
In: Romanos: exposição sobre o capítulo 9 - o soberano propósito de Deus

A "injustiça" de Deus

Predestinação é uma palavra que provoca alergia em muita gente. É só dizer que Deus predestinou alguns para a salvação enquanto os demais foram deixados no pecado, que a grita é geral. “Isso é injustiça!”, “Deus é injusto!”.

Bem, seja como for, os escritores sagrados falam da predestinação. Paulo, por exemplo: “Porque Deus nos escolheu nele [Cristo] antes da criação do mundo [...]. Em amor nos predestinou…” (Ef 1.4-5).

Mas o fato de Deus não ter predestinado todos para a salvação seria “injustiça”? Pensemos.

Todos os homens, sem exceção, são pecadores; portanto, se todos fossem abandonados na perdição, isso seria plenamente justo da parte de Deus. Todos e cada um receberiam a justa paga pelo seu pecado. Mas Deus, que é soberano, decidiu escolher alguns e tirá-los dessa condenação, ou seja, ele não quis que todos perecessem, mas que alguns fossem salvos.

Desse modo, ele continuou sendo justo para com os que se perdem, pois são pecadores, mas demonstrou misericórdia para com os seus eleitos, os quais ele perdou em Cristo na cruz.

“Ah! Mas eu acho que ele deveria salvar todos”, diz alguém. Responde Deus: “Não me é lícito fazer o que quero do que é meu?” (Mt 20.15). Acho bom você ir se acostumando com a soberania de Deus.

José Moreno, um bispo anglicano que aceita a soberania de Deus.

Cristo, nosso advogado

Cremos que nenhum acesso temos a Deus, senão pelo único Mediador [l] e Advogado Jesus Cristo, o Justo [2]. Porque Ele se tornou homem e uniu as naturezas divina e humana, para que nós, homens, tivéssemos acesso à majestade divina [3]. De outro modo, nenhum acesso teríamos. Mas este Mediador que o Pai constituiu entre Ele e nós, não nos deve assustar por sua grandeza, a ponto de fazer-nos procurar um outro, conforme nossa própria vontade. Porque não há ninguém , nem no céu, nem na terra, entre as criaturas, que nos ame mais que Jesus Cristo [4]. "Pois ele, subsistindo em forma de Deus ... a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens" por nós, "em todas as coisas ... semelhante aos irmãos" (Filipenses 2:6,7; Hebreus 2:17).

Agora, se tivéssemos que buscar outro mediador que nos fosse favorável, quem poderíamos encontrar que mais nos amasse senão Ele que entregou sua vida por nós, sendo nós ainda inimigos (Romanos 5:8,10)? E se tivéssemos que buscar alguém que tivesse poder e estima, quem os teria tanto quanto Ele que está sentado a direita de seu Pai [5], e que tem "toda a autoridade... no céu e na terra" (Mateus 28:18)? E quem será ouvido antes do que o próprio bem-amado Filho de Deus [6]?

Foi, então, somente falta de confiança que levou os homens ao costume de desonrar os santos em vez de honrá-los. Pois fazem o que estes santos jamais fizeram ou desejaram mas sempre rejeitaram conforme era seu dever [7], como mostram seus escritos.

Aqui não se deve alegar que não somos dignos; pois não apresentamos as orações a Deus em razão de nossa dignidade, mas somente pela excelência e dignidade de nosso Senhor Jesus Cristo [8], cuja justiça é a nossa, mediante a fé [9]. Por isso, a Escritura nos diz, querendo tirar de nós esse tolo receio, ou antes, essa falta de confiança, que Jesus Cristo tornou-se "em todas as coisas... semethante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote nas coisas referentes a Deus, e para fazer propiciação pelos pecados do povo. Pois naquilo que ele mesmo sofreu, tendo sido tentado, é poderoso para socorrer os que são tentados" (Hebreus 2:17,18). E a Escritura diz também, para animar-nos ainda mais a ir para Ele: "Tendo, pois, a Jesus, o Filho de Deus, como grande sumo sacerdote que entrou nos céus, conservemos firmes a nossa confissão. Porque não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas, antes foi ele tentado em todas as coisas, a nossa semelhança, mas sem pecado. Acheguemo-nos, portanto, confiadamente, junto ao trono da graça, a fim de recebermos misericordia e acharmos graça para socorro em ocasião oportuna" [10] (Hebreus 4:14-16). A Escritura diz ainda: "Tendo, pois, irmãos, intrepidez para entrar no Santo dos santos, pelo sangue de Jesus... aproximemo-nos... em plena certeza de fé etc." (Hebreus 10:19-22). E também: Cristo "tem o seu sacerdócio imutável. Por isso, também pode salvar totalmente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles" [11] (Hebreus 7:24,25).

Então, do que precisamos mais, visto que o próprio Cristo declara: "Eu sou o camninho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim" (João 14:6)? Por que buscaríamos outro advogado visto que agradou a Deus nos dar seu Filho como Advogado? Não O abandonemos para buscar outro que nunca encontraremos. Pois quando Deus O deu a nós, bem sabia que éramos pecadores.

Por isso, conforme o mandamento de Cristo, invocamos o Pai celestial mediante Cristo, nosso únicoMediador [12], como nos foi ensinado na oração do Senhor [13]. E temos a certeza de que o Pai nos concederá tudo o que Lhe pedirmos em nome de Cristo [14] (João 16:23).

1 1Tm 2 5. 2 1Jo 2:1. 3 Ef 3:12. 4 Mt 11: 28; Jo 15:13; Ef 3:19; 1Jo 4:10. 5 Hb 1:3; Hb 8:1. 6 Mt 3:17; Jo 11:42; Ef 1:6. 7 At 10:26; At 14:15. 8 Jr 17:5,7; At 4:12. 9 1Co 1:30. 10 Jo 10:9; Ef 2:18; Hb 9:24. 11 Rm 8:34. 12 Hb 13:15. 13 Mt 6:9-13; Lc 11:2-4. 14 Jo 14:13.

Confissão de Fé Belga
Artigo 26

A santificação

Cremos que a verdadeira fé, tendo sido acesa no homem pelo ouvir da Palavra de Deus e pela obra do Espírito Santo [l], regenera o homem e o torna um homem novo [2]. Esta verdadeira fé o faz viver na vida nova e o liberta da escravidão do pecado [3].

Por isso, é impossível que esta fé justificadora leve os homens a se descuidarem da vida piedosa e santa [4]. Pelo contrário, sem esta fé jamais farão alguma coisa por amor a Deus [5], mas somente por amor a si mesmos e por medo de serem condenados. É impossível, portanto, que esta fé permaneça no homem sem frutos. Pois, não falamos de uma fé vã, mas da fé, de que a Escritura diz que "atua pelo amor" (Gálatas 5:6). Ela move o homem a exercitar-se nas obras que Deus mandou na sua Palavra. Estas obras, se procedem da boa raíz da fé; são boas e agradáveis a Deus, porque todas elas são santificadas por sua graça.

Entretanto, elas não são levadas em conta para nos justificar. Porque é pela fé em Cristo que somos justificados, mesmo antes de fazermos boas obras [6]. De outro modo, estas obras não poderíam ser boas, assim como o fruto da árvore não pode ser bom, se a árvore não for boa [7].

Então, fazemos boas obras, mas não para merecermos algo. Pois, que mérito poderíamos ter? Antes, somos devedores a Deus pelas boas obras que fazemos e não Ele a nós [8]. Pois, "Deus e quem efetua em" nós "tanto o querer como o realizar, segundo sua boa vontade" (Filipenses 2:13). Então, levemos a sério o que está escrito: "Assim também vós, depois de haverdes feito quanto vos foi ordenado, dizei: Somos servos inúteis, porque fizemos apenas o que devíamos fazer" (Lucas 17:10). Contudo, não queremos negar que Deus recompensa as boas obras [9]; mas, por sua graça, Ele coroa seus próprios dons.

E, em seguida, mesmo que façamos boas obras, nelas não fundamentamos nossa salvação. Porque, por sermos pecadores, não podemos fazer obra alguma que não esteja contaminada e não mereça ser castigada [10]. E, ainda que pudéssemos produzir uma só boa obra, a lembrança de um só pecado bastaria para torná-la rejeitável perante Deus [11]. Assim, sempre duvidaríamos, levados de um lado para o outro, sem certeza alguma, e nossa pobre consciência estaria sempre aflita, a não ser que se apoiasse no mérito do sofrimento e da morte de nosso Salvador [12].

1 At 16:14; Rm 10:17; 1Co 12:3. 2 Ez 36:26, 27; Jo 1:12,13; Jo 3:5; Ef 2:4-6; Tt 3:5; 1Pe 1:23. 3 Jo 5:24; Jo 8:36; Rm 6:4-6; 1Jo 3:9. 4 Gl 5:22; Tt 2:12. 5 Jo 15:5; Rm 14: 23; 1Tm 1:5; Hb 11:4,6. 6 Rm 4:5. 7 Mt 7:17. 8 1Co 1:30: 1Co 4:7; Ef 2:10. 9 Rm 2:6,7; 1Co 3:14; 2Jo :8; Ap 2:23. 10 Rm 7:21. 11 Tg 2:10. 12 Hc 2:4; Mt 11:28; Rm 10:11.

Confissão de Fé Belga
Artigo 24

Nossa justiça perante Deus em Cristo

Cremos que nossa verdadeira felicidade consiste no perdão dos pecados, por causa de Jesus Cristo, e que isto significa para nós a justiça perante Deus [l]. Assim nos ensinam Davi e Paulo, declarando: "Bem-aventurado o homem a quem Deus atribui justiça, independentemente de obras" (Romanos 4:6; Salmo 32:2). E o mesmo apóstolo diz que somos "justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus" [2] (Romanos 3: 24).

Portanto, perseveramos neste fundamento, dando toda a glória a Deus [3], humilhando-nos e reconhecendo que nós, homens, somos maus. Não nos vangloriamos, de nenhuma maneira, de nós mesmos ou de nossos méritos [4]. Somente nos apoiamos e repousamos na obediência do Cristo crucificado [5]. Esta obediência é nossa se cremos nEle [6]. Ela é suficiente para cobrir todas as nossas iniqüidades. Ela liberta nossa consciência de temor, perplexidade e espanto e, assim, nos dá ousadia de aproximarmo-nos de Deus, sem fazermos como nosso primeiro pai Adão que, tremendo, quis cobrir-se com folhas de figueira [7]. E, certamente, se tivéssemos que comparecer perante Deus, apoiando-nos, por pouco que fosse, em nós mesmos ou em qualquer outra criatura - ai de nós -, pereceríamos [8]. Por isso, cada um deve dizer com Davi: "Ó Senhor, não entres em juízo com o teu servo, porque a tua vista não há justo nenhum vivente" (Salmo 143:2).

1 1Jo 2:1. 2 2Co 5:18,19; Ef 2:8; 1Tm 2:6. 3 Sl 115:1; Ap 7:10-12. 4 1Co 4:4; Tg 2:10. 5 At 4:12; Hb 10:20. 6 Rm 4:23-25. 7 Gn 3:7; Sf 3:11; Hb 4:16; 1Jo 4:17-19. 8 Lc 16:. 15; Fp 3:4-9.

Confissão de Fé Belga
Artigo 23

Justificação pela fé em Cristo

Cremos que, para obtermos verdadeiro conhecimento desse grande mistério, o Espírito Santo acende, em nosso coração, verdadeira fé [1]. Esta fé abraça Jesus Cristo com todos os seus méritos, apropria-se dEle e nada mais busca fora dEle [2]. Pois das duas, uma: ou não se ache em Jesus Cristo tudo o que é necessário para nossa salvação, ou tudo se acha nEle, e, então, aquele que possui Jesus Cristo pela fé, tem a salvação completa [3]. Dizer porém que Cristo não é suficiente, mas que, além dEle, algo mais é necessário, significaria uma blasfêmia horrível. Pois Cristo seria apenas um salvador incompleto.

Por isso, dizemos, com razão, junto com o apóstolo Paulo, que somos justificados somente pela fé, ou pela fe sem as obras [4] (Romanos 3:28). Entretanto, não entendemos isto como se a própria fé nos justificasse [5], mas ela é somente o instrumento com que abraçamos Cristo, nossa justiça. Mas Jesus Cristo, atribuindo-nos todos os seus méritos e tantas obras santas, que fez por nós e em nosso lugar, é nossa justiça [6]. E a fé é o instrumento que nos mantém com Ele na comunhão de todos os seus benefícios. Estes, uma vez dados a nós, são mais que suficientes para nos absolver dos pecados.

1 Jo 16:14; 1Co 2:12; Ef 1:17,18. 2 Jo 14:6; At 4:12; Gl 2:21. 3 Sl 32:1; Mt 1:21; Lc 1: 77; At 13:38,39; Rm 8:1. 4 Rm 3:19-4:8; Rm 10:4-11; Gl 2:16; Fp 3:9; Tt 3:5. 5 1Co 4:7. 6 Jr 23:6; Mt 20:28; Rm 8:33; 1Co 1:30,31; 2Co 5:21; 1Jo 4:10.

Confissão de Fé Belga
Artigo 22

Salvo para a Glória

Eu me lembro de dar uma aula sobre Efésios 1 em janeiro de 1976 como professor visitante na Bethel College. Eu desenvolvi a aula sistematicamente ao longo dos primeiros catorze versículos de Efésios e minha mente novamente foi constantemente espantada. Isso porque três vezes nos versículos 6, 12 e 14 — Paulo diz que Deus nos escolheu em Jesus antes da fundação do mundo e nos predestinou para sermos seus filhos para o louvor da glória de sua graça.

Ele escolheu você. Por quê? Para que sua glória e graça possam ser louvadas e magnificadas. Sua salvação é glorificar a Deus. Sua eleição é glorificar a Deus. Sua regeneração é glorificar a Deus. Sua justificação é para a glória de Deus. Sua santificação é para a glória de Deus, e um dia, sua glorificação será um mergulho na glória de Deus. 

Você foi criado para a glória de Deus. Isaías 43.6-7: "Trazei meus filhos de longe e minhas filhas, das extremidades da terra, os que criei para minha glória"

Deus resgatou seu povo Israel do Egito para a sua glória. Salmo 106.7-8: "Nossos pais, no Egito, não atentaram às tuas maravilhas; foram rebeldes junto ao Mar Vermelho. Mas ele os salvou por amor do seu nome, para lhes fazer notório o seu poder".

Em outras palavras, ele dividiu o Mar Vermelho e salvou seu povo rebelde para que ele fizesse notório o seu poder; e sua fama se espalhou até Jericó e salvou uma prostituta, de maneira que quando os israelitas chegaram lá e estavam prontos para soprar as trombetas, ela já tinha nascido de novo, pois ela disse: "Ouvimos o seu nome e o seu renome", e uma mulher e sua família creram em um Deus teocêntrico e escaparam da destruição.

Deus teve misericórdia de Israel no deserto  para a sua glória. Deus poupou Israel no deserto diversas vezes. "A casa de Israel se rebelou contra mim no deserto", disse Ezequiel citando Deus, "Então, eu disse que derramaria sobre eles o meu furor no deserto, para os consumir. O que fiz, porém, foi por amor do meu nome, para que não fosse profana do diante das nações" (20.13-14). Então, finalmente Deus os envia para o julgamento na Babilônia, e após 70 anos, a misericórdia começa a se aproximar deles. Ele não se divorciará da sua noiva da aliança, e ele os traz de volta, mas por quê?

Qual é o motivo enraizado no coração de Deus? Ouça a resposta de leaíae 48.9-11: "Por amor do meu nome, retardarei a minha ira e por causa da minha honra me conterei para contigo, para que te não venha a exterminar. Eis que te acrisolei, mas disso não resultou prata; provei-te na fornalha da aflição. Por amor de mim, por amor de mim, é que faço isto; porque como seria profanado o meu nome? A minha glória, não a dou a outrem". Esse é um motivo teocêntrico para a misericórdia. 

Jesus veio e morreu para a glória de Deus. Jesus veio ao mundo por qual razão? Ah, quantas vezes já citamos João 3.16, e isso é gloriosamente verdadeiro. Antes que esta mensagem termine, espero que você veja que tal ênfase (a glória de Deus) e a ênfase que você conhece há muito tempo (sua alegria) não estão em desacordo. 

Mas por que Jesus veio? De acordo com Romanos 15.8-9, ele veio por esta razão: "Cristo foi constituído ministro da circuncisão, em prol da verdade de Deus, para confirmar as promessas feitas aos nossos pais; e para que os gentios glorifiquem a Deus por causa da sua misericórdia". Jesus veio à terra, tornou se totalmente humano e morreu para que você desse glória ao seu Pai pela misericórdia. Ele veio por amor ao seu Pai. Essa é a razão principal de sua vinda: a glória do seu Pai, e sua glória alcança seu ápice no derramamento da misericórdia. 

Ouça esta palavra de Romanos 3.25-26: Deus propôs a Cristo, no seu sangue, como propiciação para manifestar a justiça de Deus. Isso foi para provar, no tempo presente, que ele mesmo é justo. Foi por isso que ele morreu. Ele morreu para vindicar a justiça de Deus que havia deixado impunes pecados como os de Davi, o adultério e o assassinato. 

Em algum momento você já se incomodou que Deus tenha deixado impune o adultério do Rei Davi, e Davi simplesmente continuou sendo rei? Bom, isso incomodou Paulo até às profundezas de seu ser, que Deus não seja justo e deixe pecados impunes. E não foi apenas Davi. Houve milhares de santos no Antigo Testamento (e hoje) cujos pecados Deus simplesmente esquece e ignora. E Paulo clamou: "Como tu podes ser Deus e fazer isso? Como tu podes ser justo e fazer isso? Como tu podes ser reto e fazer isso? Como tu podes ser digno de adoração e fazer isso? Se qualquer juiz aqui em Austin fizesse isso — se ele absolvesse um pedófilo, um estuprador ou um assas sino ele seria demovido imediatamente, e ainda assim Deus faz isso todos os dias. Então, podemos perguntar: "Que tipo de Deus é você?".

A cruz é a solução para um mega problema teológico, a saber: Como Deus pode ser Deus e perdoar pecados? Jesus veio para vindicar a Deus pela salvação de pessoas como você e eu. A salvação é uma coisa grandemente e gloriosamente teocêntrica. 

Jesus retornará para receber glória. Por que ele voltará? Jesus está voltando, e deixe-me te dizer por que ele está voltando e o que você pode fazer quando ele voltar, para que você esteja pronto e o faça. 2 Tessalonicenses 1.8-10: "Os que não obedecem ao evangelho de nosso Senhor Jesus (...) sofrerão penalidade de eterna destruição, banidos da face do Senhor e da glória do seu poder, quando ele vier para ser glorificado nos seus santos e ser admirado em todos os que creram, naquele dia". Você consegue ver essas duas coisas? Ele está vindo para ser glorificado (magnificado) em seus santos e para ser admirado. Se você não começar isso agora, você não será capaz de fazê-lo quando ele voltar. 

Esta conferência existe para acender um fogo em seus ossos e para iniciar um incêndio em suas mentes e em seus corações, a fim de prepará-los para encontrar o Rei Jesus, de maneira que vocês continuem por toda a eternidade fazendo o que ele criou vocês para fazerem; a saber, admirá-lo e magnificá-lo.

John Piper
In: Uma paixão consumidora por Jesus (obtenha o ebook completo, gratuitamente, clicando no link)