Fundamentos da Missão: Amor

Chegando um dos escribas, tendo ouvido a discussão entre eles, vendo como Jesus lhes houvera respondido bem, perguntou-lhe: Qual é o principal de todos os mandamentos? Respondeu Jesus: O principal é: Ouve, ó Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor! Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de toda a tua força. O segundo é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Não há outro mandamento maior do que estes.” (Marcos 12.28–31)
Missões existem por causa da adoração. Por que há no mundo quem não adora a Deus, a obra missionária existe e permanece uma tarefa urgente. No texto que vamos considerar hoje essa verdade não é declarada imediatamente, mas pode ser inferida quando examinada mais de perto.

Um homem pergunta a Jesus qual é o principal mandamento da Lei. Os mestres judeus identificaram e classificaram 613 mandamentos, sendo 365 proibições e 248 ordenanças, que eles associaram aos dias do ano solar e ao número de ossos ou partes do corpo humano, respectivamente. Grande parte do debate residia na ordem de importância de cada um dos mandamentos listados. Daí a pergunta do escriba: Qual é o principal de todos os mandamentos? (Mc 12.28).

Antes de citar o mandamento em si, como Moisés já havia feito em Dt 6:4, Jesus apresenta a base, o fundamento sobre o qual se podia dizer que era o mais importante: Respondeu Jesus: O principal é: Ouve, ó Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor! (Mc 12.29)”. Sem considerar este fundamento, o mandamento expresso perde sua força e sua importância fica dependente da ideia romântica que o homem tem do amor. E sua relação com as missões não é percebida.

Quando Jesus assentou este fundamento, ele estabeleceu que o teísmo bíblico é a verdade sobre Deus, excluindo todos os sistemas rivais ao cristianismo. A palavra “Deus” pressupõe sua existência e exclui o ateísmo. Ao dizer que Ele é “único” destrói o politeísmo. Ao chama-lo “Senhor”, associando-o a Jeová e Pai de Jesus, elimina o deus maometano. Ao dizer que é “nosso” revela sua pessoalidade e refuta tanto o deísmo como o panteísmo. Resta então a crença no Deus vivo, único e verdadeiro, Criador dos céus e da Terra, soberano sobre tudo e sobre todos! O que era, que é e que há de vir!

Há aqui uma implicação útil à nossa compreensão de missões. A primeira delas é que Deus, assim descrito, tem todo o direito de exigir e ordenar a adoração e obediência de todo homem, sendo justo ao condenar aquele que se recusa a dobrar joelhos e confessar o seu nome. Portanto, todos os que não o reconhecem como Senhor estão perdidos.

Continuando sua resposta, Jesus então expressa sua resposta: “Amarás, pois” (Mc 12:30a). Do que Deus é, decorre que devemos amá-lo. O amor a Deus não é um sentimento que brota naturalmente em nosso coração. Ele resultada do conhecimento de quem e como Deus é. E na medida em que compreendemos melhor o que Deus revela de Si, vai ficando claro como devemos amar esse Deus inigualável. E esse progresso é pessoal: “o Senhor, teu Deus” (Mc 12:30b).

“De todo o teu coração” (Mc 12:30c), ou seja, em perfeita sinceridade. Até quando coxeareis entre dois pensamentos? Se o Senhor é Deus, segui-o; se é Baal, segui-o” (1Rs 18.21). “De toda a tua alma” (Mc 12:30d), com fervor, paixão, emoção! Bendize, ó minha alma, ao Senhor (Sl 103.22). De todo o teu entendimento” (Mc 12.30), vale dizer, com pleno uso da razão iluminada pelo Espírito. A fé não é irracional, nem cega. Finalmente, De toda a tua força (Mc 12.30), com toda a energia do nosso ser. O amor a Deus não é um sentimento passivo, mas algo que deve dominar todas as faculdades do homem.

Então o Senhor fala do segundo mandamento principal, mesmo que o interrogador tivesse perguntado apenas pelo primeiro. O segundo é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo (Mc 12.31). E aqui temos um mandamento mal compreendido, especialmente quanto a expressão “como a ti mesmo”.

Primeiramente, devemos considera-lo em oposição ao que foi dito sobre o amor devido a Deus. Não devemos amar a nós mesmo de todo coração, de toda nossa alma, de todo nosso entendimento e com todas as nossas forças. Só Deus deve ser amado assim. Portanto, temos aqui um mandamento contra a idolatria. Por outro lado, sabemos que justa condenação recai sobre os que não adoram a Deus nesses termos. E não queremos isso para nós. Desejamos, antes, a felicidade eterna na glória. Então, adoramos a Deus. Este é o amor que devemos ter a nós mesmos.

Compreendido o que significa amar a si mesmo, podemos entender o que significa “amarás o próximo como a ti mesmo”. Da mesma forma como desejamos para nós a felicidade eterna e queremos evitar o sofrimento eterno, devemos desejar o mesmo para nosso próximo. Isso é amar o próximo. Não endeusamos o próximo, criatura como nós, mas queremos o seu bem.

Juntando os dois mandamentos podemos relacionar isso com nosso dever missionário. Se amamos a Deus, vamos desejar que Ele seja adorado em todo lugar e por todos os homens. Se amamos aos homens como a nós mesmos, não vamos querer que sejam condenados por negar a Deus ou por não o glorificarem como Ele realmente é.

E considerando como devemos amar a Deus, compreendemos como deve ser nossa dedicação na pregação do evangelho no mundo todo. Devemos colocar nossos corações, almas, mentes e esforços naquilo que fazemos no Reino. Com isso, missões não será um programa ou um departamento da igreja, mas a vida normal da igreja e de todo crente. 

Soli Deu Gloria

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"Se amássemos mais a glória de Deus, se nos importássemos mais com o bem eterno das almas dos homens, não nos recusaríamos a nos engajar em uma controvérsia necessária, quando a verdade do evangelho estivesse em jogo. A ordenança apostólica é clara. Devemos “manter a verdade em amor", não sendo nem desleais no nosso amor, nem sem amor na nossa verdade, mas mantendo os dois em equilíbrio (...) A atividade apropriada aos cristãos professos que discordam uns dos outros não é a de ignorar, nem de esconder, nem mesmo minimizar suas diferenças, mas discuti-las." John Stott

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