O batismo pelos mortos


Doutra maneira, que farão os que se batizam pelos mortos, se absolutamente os mortos não ressuscitam? Por que se batizam eles então pelos mortos? 1Co 15:29

Seguramente, este é um dos versículos mais difíceis de toda a Bíblia. Por conta disso há mais de 200 interpretações diferentes para ele, sendo que desses estima-se que umas 12 sejam ortodoxamente aceitáveis. A maioria contraria o ensino geral das Escrituras e devem ser, por isso, rejeitadas. A mais famosa dessas interpretações erradas é a que tenta justificar o batismo vicário, praticado no passado pelos marcionitas e atualmente pelos mórmons.

Duas coisas devem ser ditas antes de mais nada. A primeira é que embora Paulo faça referência a uma prática corrente na igreja corintiana, não a endossa. Isso fica claro, por exemplo, nos pronomes utilizados. Ele não diz "nós batizamos pelos mortos", mas "os que se batizam" e "se batizam eles". Note a diferença com o verso seguinte em que diz "estamos nós" (1Co 15:30). Portanto, independente do que essa prática significava, Paulo não a praticava nem a recomendou.
A segunda observação é a que dá conta de que nenhuma doutrina pode ser baseada numa passagem bíblica isolada, sem o apoio do ensino geral das Escrituras, ainda mais uma passagem obscura como essa. Quando essa regra não é observada, doutrinas absurdas podem resultar disso. Por exemplo, se tomarmos o verso 18 isoladamente poderíamos ensinar que os que não estiverem vivos por ocasião da volta de Cristo estão perdidos: "E também os que dormiram em Cristo estão perdidos".

As diversas explicações dadas a essa passagem podem ser agrupadas conforme se baseiam no sentido dado às palavras "batismo", "pelos" e "morte", respectivamente. Analisemos rapidamente cada uma dessas possibilidades, a título de esclarecimento.
A primeira delas assume batismo em seu sentido natural e implica no chamado batismo vicário, onde uma pessoa se batiza em lugar de outras, sobre as quais o batismo produz seus efeitos. Contra essa posição, podemos argumentar que é supersticiosa e parte de pontos de vista errados sobre a natureza e eficácia do batismo, que não há indícios dessa prática antes do segundo século e que mesmo assim nunca foi praticado pela igreja, mas apenas por grupos heréticos condenados pelo consenso cristão. Além disso, parece estranho que Paulo se referisse ao batismo vicário sem condená-lo. Uma segunda linha de interpretação toma a palavra batismo em sentido figurado, como usado em Mt 20:22 e Lc 12:50. De acordo com este ponto de vista, Paulo está se referindo a um batismo de aflições, no qual os crentes eram imergidos naquela época de perseguição.

Um outro grupo de interpretações focaliza o sentido da palavra grega huper, traduzido "pelos" pela Almeida Corrigida Fiel, Almeida Corrigida e Edição Contemporânea de Almeida. A Almeida Revista e Atualizada traz "por causa" (ARA) e a Nova Tradução na Linguagem de Hoje traduz "em favor". Outras traduções sugeridas são "por cima" e "em lugar". Duas interpretações se destacam baseadas no sentido da palavra huper. Uma delas afirma que os crentes eram batizados ao longo do túmulo dos mártires, para expressar a fé na ressusrreição. A outra afirma que os novos crentes eram batizados para assumir o lugar dos falecidos da igreja.

Finalmente, outro grupo de interpretação se concentra no significado da palavra mortos. Alguns entendem que a referência é aos que são batizados para a morte e que não teria sentido batizar um corpo que jamais irá ressuscitar. Todos os que são batizados recebem a ordenança de crerem que seu corpo não permanecerá morto. Outros vêem uma referência aos que estão à beira da morte, logo, "por que batizar os que estão prestes a morrer se não há ressurreição?". E outros ainda que os mortos aqui são os perdidos, que estão mortos em pecados e delitos, sendo assim, os crentes são batizados em favor dos que ainda estão perdidos ou seja, para serem enviados a eles, o que não faria sentido se não houvesse ressurreição.

Como dissemos, a passagem é difícil e seria muita presunção apresentar uma interpretação como definitiva. Então apenas indico a que entendo ser a mais coerente com o ensino bíblico geral. Fico com a explicação de que a prática era de batizar novos crentes em lugar de pessoas falecidas na igreja.

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"Se amássemos mais a glória de Deus, se nos importássemos mais com o bem eterno das almas dos homens, não nos recusaríamos a nos engajar em uma controvérsia necessária, quando a verdade do evangelho estivesse em jogo. A ordenança apostólica é clara. Devemos “manter a verdade em amor", não sendo nem desleais no nosso amor, nem sem amor na nossa verdade, mas mantendo os dois em equilíbrio (...) A atividade apropriada aos cristãos professos que discordam uns dos outros não é a de ignorar, nem de esconder, nem mesmo minimizar suas diferenças, mas discuti-las." John Stott

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