Dízimo: uma breve história - 1


A primeira pessoa a dar dízimos na Bíblia foi Abraão. Quando Melquisedeque veio ao seu encontro, trazendo pão e vinho após uma batalha, "de tudo lhe deu Abrão o dízimo" (Gn 14:20). Entretanto, a prática do dízimo não começou com Abraão e não se pode dizer que foi uma prescrição divina feita a ele.

A literatura antiga indica que a prática do dízimo era comum entre o povo semita e outros povos da antigüidade. Muitas vezes se restringia a um imposto pago aos reis ou conquistadores, mas era geralmente relacionado com o sagrado. O dízimo de Abraão se dá num contexto político e religioso, pois Melquisedeque era não apenas rei de Salém mas também "sacerdote do Deus Altíssimo" (Hb 7:1).

A palavra dízimo no Antigo Testamento vem de ma‘aser e significa "décima parte". Geralmente estava relacionado ao pagamento de um décimo dos frutos da terra e dos animais. A origem da quantidade pode estar relacionado ao sistema de contagem decimal, baseado nos dedos das mãos e também ao fato de que dez é em si mesmo considerado perfeito, além de ser a soma de dois outros números considerados sagrados: sete e três.

Depois de Abraão, vemos seu neto Jacó prometendo que "de tudo quanto me concederes, certamente eu te darei o dízimo" (Gn 28:22). As circunstâncias dessa promessa são bem conhecidas, mas como, e se ele de fato cumpriu a promessa, não é possível saber. Do ato de Abraão e do voto de Jacó pode-se deduzir que o dízimo era uma prática esporádica, como retribuição pelo sucesso em situações marcantes, como uma batalha ou jornada. Era uma forma de reconhecer o direito soberano de Deus sobre os sucessos da vida.

Foi durante a trajetória dos filhos de Israel pelo deserto que o dízimo surgiu como uma prescrição da lei. Estranhamente, porém, as leis sobre o dízimo não constam do livro de Êxodo. Além disso, o restante do pentateuco apresenta posições diversas a respeito da prática do dízimo, o que pode significar que a mesma mudou de acordo com o momento ou a situação experimentada por Moisés e o povo no deserto. Essas variações incluem tanto o propósito como a forma de praticar o dízimo.

Levíticos é o único livro a declarar "que todas as dízimas da terra, tanto dos cereais do campo como dos frutos das árvores, são do Senhor" (27:10) e nele o dízimo não é atribuído ao levita. A sua aplicação é geral, sobre os frutos da terra e do rebanho, sendo permitido que se faça o resgate dos dízimos sobre a colheita, com o acréscimo da quinta parte de seu valor.

Em Números é que Deus diz "aos filhos de Levi dei todos os dízimos em Israel por herança, pelo serviço que prestam, serviço da tenda da congregação" (18:21), os quais, por sua vez, deveriam apresentar "uma oferta ao Senhor, o dízimo dos dízimos" (18:26), entregues aos sacerdotes. E como o povo ainda não estava estabelecido na Terra, o dízimo poderia ser comido "em todo lugar, vós e a vossa casa, porque é vossa recompensa pelo vosso serviço na tenda da congregação" (18:31).

Já no livro de Deuteronômio, o dízimo é tratado sob a perspectiva do estabelecimento na Terra Prometida. Assim, a ordem agora é "nas tuas cidades, não poderás comer o dízimo" (12:17) pois "haverá um lugar que escolherá o Senhor, vosso Deus... a esse lugar fareis chegar tudo o que vos ordeno: os vossos holocaustos, e os vossos sacrifícios, e os vossos dízimos" (12:11). A entrega do dízimo se daria mediante um ritual familiar, no qual "comerás [o dízimo] perante o Senhor, teu Deus, no lugar que o Senhor, teu Deus, escolher, tu, e teu filho, e tua filha, e teu servo, e tua serva, e o levita que mora na tua cidade; e perante o Senhor, teu Deus, te alegrarás em tudo o que fizeres" (12:18). Porém, a cada três anos, o dízimo seria retido nas cidades e entregues aos levitas e necessitados, conforme a prescrição "ao fim de cada três anos, tirarás todos os dízimos do fruto do terceiro ano e os recolherás na tua cidade" (14:28) e "quando acabares de separar todos os dízimos da tua messe no ano terceiro, que é o dos dízimos, então, os darás ao levita, ao estrangeiro, ao órfão e à viúva, para que comam dentro das tuas cidades e se fartem" (26:12).

Todas as demais citações sobre o dízimo no Antigo Testamento não alteram as disposições do Pentatêuco, mas indicam que o povo freqüentemente as descumpriam, retornando à prática em momentos de reforma e reavivamento. Nos dias de Ezequias, foi necessário uma ordem para que o povo "contribuísse com sua parte devida aos sacerdotes e aos levitas, para que pudessem dedicar-se à Lei do Senhor" (2Cr 31:4) sendo que "logo que se divulgou esta ordem, os filhos de Israel trouxeram em abundância as primícias do cereal, do vinho, do azeite, do mel e de todo produto do campo; também os dízimos de tudo trouxeram em abundância" (2Cr 31:5).

No pós-exílio, "os quinhões dos levitas não se lhes davam, de maneira que os levitas e os cantores, que faziam o serviço, tinham fugido cada um para o seu campo" (Ne 13:10). Neemias fez todos retornarem aos seus postos na casa de Deus e "todo o Judá trouxe os dízimos dos cereais, do vinho e do azeite aos depósitos" (Ne 13:12). Mas a mesma situação se verificou durante o ministério de Malaquias: "Roubará o homem a Deus? Todavia, vós me roubais e dizeis: Em que te roubamos? Nos dízimos e nas ofertas" (Ml 3:8). Assim, a história do dízimo no Antigo Testamento termina com uma nota triste.

Continua...

Soli Deo Gloria

15 comentários:

  1. O estudo tá indo bem...estou curioso em ler o restante.

    Ah....vocÊ não vai pedir uma ofertinha para os irmãos????? rsrsrs

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  2. Daniel,

    Paz!

    Não vou pedir, mas sentiu no coração "é de Deus"! :-)

    Em Cristo,

    Clóvis

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Ótima postagem Clovis, estou esperando o complemento neotestamentário.

    Fica na Paz,

    Ednaldo.

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  5. Ednaldo,

    Se Deus quiser, postarei sobre o NT e na História da Igreja.

    Em Cristo,

    Clóvis

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  6. Quando teremos a continuidade?

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  7. Caro Anônimo,

    Obrigado pelo interesse. Aguarde para esses dias a segunda parte.

    Em Cristo,

    Clóvis

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  8. A questão dos dízimos está desviada do nosso contexto Crsitão - fala-e muito do que Paulo, Pedro, etc pregavam e desprezamos o que Cristo deixou. - Dízimo é contribuição p/o sustento físico da "obra" missionária. - No caso da Igreja Católica, isso vem de doações vultosas do Estado e de alguns fiéis que pensam "comprar" os favores de Deus.
    A maioria dos evangélicos pregam a obrigatoriedade, aplicando os conceitos judaicos. Jesus não faz mensão, não dá importância, não recebeu, e não há relato que tenha pagado tais "dívidas". Sustentar as necessidades básicas dos sacerdotes é lícito. pecado é fazer o povo passar necesidades em nome da fé e aqueles elementos viverem no luxo, na fartura, sem compromisso com resultados e ainda chamarem de ladrões os que têm outra visão.
    Católicos e evangélicos sofrem do mesmo mal. Lideranças hipócritas.
    PS: Sou cristão e não abro mão.

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  9. Hilton,

    Obrigado pela sua visita e pelos seus comentários. Gostaria que acompanhasse a sequencia de estudos, com sua participação.

    Em Cristo,

    Clóvis

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  10. Nas igrejas em geral o dizimo e a oferta estao ligados a bençao e maldiçao, á prosperidade e a dificuldade, que ironia, sou judeu e afirmo que o dizimo era uma lei mosaica para o sustento do sacerdocio levitico, e que por conseguinte é um bom modelo de contribuiçao para o ministerio da igreja, e que contribui-se segundo a prosperidade de cada um, e isso agrada a Deus que tem sua forma de retribuir, por outro lado se voce quer de fato prosperar segundo uma verdadeira teologia de prosperidade, seja obediente e temente a Deus Jeova, observe os preceitos sobretudo no livro de proverbios, assimile tambem a mensagem de Mat 6:33

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  11. Olá, anonimo, bom dia.
    Você é um judeu-cristão?
    Digo porque você citou o livro de Mateus, que é um dos evangelhos da vinda do Messias.

    Um abraço.

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  12. Anônimo, se você é cristão então deixou de ser judeu. Não se põe vinho novo em odre velho, meu irmão. Espero que você não esteja se confundindo como a igreja no início. A Paz do Senhor. Seja bem vindo a nova aliança.

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  13. Tinha dia que eu ofertava com alegria, mas triste muitas das vezes quando tinha que dizimar sobre a renda bruta todo o mês. Me sinto mais feliz quando dou espontâneamente do que quando sou constrangida a dar o dízimo. Eu estava dando o meu dízimo, ofertava voluntariamente para as missóes e uma outra igreja quando visitava(com alegria), e no entanto passei uma luta terrível com ladrões e ainda me enrolei financeiramente por um tempo.

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  14. muito bom irmão o estudo sobre o dizimo, isso é uma questão que me preu cupa muito, mais deu de entender claramente, esperando o comentario neotestamentário. fica na paz

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  15. Este comentário foi removido por um administrador do blog.

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"Se amássemos mais a glória de Deus, se nos importássemos mais com o bem eterno das almas dos homens, não nos recusaríamos a nos engajar em uma controvérsia necessária, quando a verdade do evangelho estivesse em jogo. A ordenança apostólica é clara. Devemos “manter a verdade em amor", não sendo nem desleais no nosso amor, nem sem amor na nossa verdade, mas mantendo os dois em equilíbrio (...) A atividade apropriada aos cristãos professos que discordam uns dos outros não é a de ignorar, nem de esconder, nem mesmo minimizar suas diferenças, mas discuti-las." John Stott

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