Seria Deus um ditador?

Um pastor querido escreveu que "o Calvinismo erra nos "5 pontos" ao super-enfatizar a soberania de Deus tranformando-o num ditador". Acredito que sua preocupação com uma imagem políticamente correta de Deus seja legítima. Afinal, numa época em que a democracia é tida se não como o melhor pelo menos como o menos pior dos regimes de governo, um Ditador Divino é algo um tanto quanto indesejável. O fato porém é que Deus não nomeou ninguém seu personal stylist para melhorar a sua imagem, tornando-o mais aceitável ao mundo. O Deus que deve ser apresentado ao mundo moderno, é o mesmo que foi apresentado nos tempos bíblicos.

O que vem a ser soberania? A soberania "é um poder (faculdade de impor aos outros um comando a que eles ficam a dever obediência) perpétuo (não pode ser limitado no tempo) e absoluto (não está sujeito a condições ou encargos postos por outrém, não recebe ordens ou instruções de ninguém e não é responsável perante nenhum outro poder)". Tem como características ser "una e indivisível, própria e não delegada, irrevogável, suprema". Essa conceituação refere-se à soberania de um homem ou de um Estado. E se assim é uma soberania terrena, como seria a soberania de um Deus?

Falando em termos teológicos, a soberania de Deus é o exercício de Sua supremacia. Deus tem o poder e exerce o domínio sobre toda a Sua Criação. Nada escapa ao Seu controle e tudo Ele controla para a Sua glória. Será então que a soberania de Deus pode ser super-enfatizada? Não creio que alguém consiga dar uma ênfase maior à soberania divina que àquela que a própria Bíblia dá.

Por exemplo, Judas exclama "ao único Deus, nosso Salvador, mediante Jesus Cristo, Senhor nosso, glória, majestade, império e soberania, antes de todas as eras, e agora, e por todos os séculos. Amém!" (Jd 1:24). Deus é um imperador soberano! A palavra traduzida por império (kratos) é traduzida como poder, força e domínio em outras passagens. A palavra soberania (exousia), por sua vez, significa "liberdade de ação com poder irrefreável". Temos então que Deus exerce um poder imperial soberano ilimitado. Com essa, acho que Judas terá que se explicar pelo seu "erro calvinista".

Mas Judas pode alegar que não estava sozinho nisso. A igreja primitiva cometia o mesmo erro calvinista. Eles confessavam em oração "ouvindo isto, unânimes, levantaram a voz a Deus e disseram: Tu, Soberano Senhor, que fizeste o céu, a terra, o mar e tudo o que neles há" (At 4:24). Aqui a palavra soberano é seguida do termo Senhor e sobre este último que vamos nos deter um pouco.

Geralmente, Senhor é traduzido da palavra "kurios" e significa "aquele a quem uma pessoa ou coisas pertence, sobre o qual ele tem o poder de decisão" e "o soberano, príncipe, chefe, o imperador". A palavra já denota um grande poder de controle, porém, como Strong ressalta, "tem um sentido mais amplo, aplicável a várias posições e relações de vida e não sugestivo de propriedade ou tirania". Porém, a palavra Senhor às vezes é tradução de "despotes", de onde vem também a nossa palavra déspota, que os dicionários definem como "indivíduo que governa com poder absoluto", dito de outra forma, "déspota é o mesmo que ditador"!

Ora, acontece que quando a igreja primitiva orou a Deus, dirigiu-se a Ele chamando-o de déspota! O mesmo Strong explica que despotes "usa-se unicamente em relação a um escravo e denota direito exclusivo de posse e poder sem controle". Ou seja, goste-se ou não, Deus é chamado em oração de Déspota e ao invés de repreender a igreja, respondeu imediatamente à oração deles.

Seria esse um caso isolado, marca de uma igreja ainda não firme no conhecimento da pessoa de Deus? Não é o que parece. Pedro, também se refere a Jesus como "o Soberano Senhor" (2Pe 2:1), no que é acompanhado por Paulo que se refere ao Senhor como déspota (2Tm 2:21). Até no céu Deus é chamado de "Soberano Senhor" com o uso do termo déspota (Ap 6:10).

Portanto, não são os calvinistas que erram por super-enfatizar a soberania divina ou por transformá-lo em ditador. A soberania de Deus jamais será exagerada. São os arminianos que erram ao sacrificar a soberania de Deus no altar humanista do livre-arbítrio.

18 comentários:

  1. Do jeito que as coisas andam aqui em baixo, na terra, me levam a crer que Deus é um ditador bem democrático. hehehe

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  2. Roger,

    Democrático não, longânimo...

    Em Cristo,

    Clóvis

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  3. Piper em seu "sétimo ponto" do Calvinismo (só o Piper para inventar algo assim mesmo rsrs) diz:
    "Este é o melhor mundo de todos. O mundo que dará maior glória a Deus."

    Achos que as pessoas acham difícil de aceitar isso.

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  4. Vini,

    Não sei de onde o Piper tirou isso. Mas creio que é conseqüência lógica das perfeições de Deus. Pois um Deus infinitamente sábio, poderoso e bom, de todos as possibilidades possíveis, escolheria aquela que mais lhe glorificaria.

    Em Cristo,

    Clóvis

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  5. O Piper "inventou".
    Tem este artigo no Monergismo

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  6. Mano,
    publiquei um post sobre a questáo da soberania.
    http://confraria-pentecostal.blogspot.com/

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  7. Louvemos a Deus pela sua Soberania. Afinal, se Deus é um ditador (dependendo do que entendemos quanto a este termo) é um ditador amoroso, bondoso, benigno, compassivo...Resumindo, para quem conhece os atributos divinos, reconhecer a Soberania Divina é um conforto, um convite a adoração mais sincera...Agora, se a soberania deste mundo estivesse na mão de Satanaz, ai sim, teriamos muito a perder.

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  8. Cleber,

    Paz seja contigo.

    Eu li o seu post e se você não considerar provocação, gostaria de comentá-lo.

    Farei isso assim que der.

    Em Cristo,

    Clóvis

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  9. Daniel,

    Em seu livro "A soberania de Deus", Pink pergunta: quem está no controle do mundo, Deus ou o Diabo?

    Ao rejeitar o absoluto domínio de um, concedemos pelo menos um domínio parcial ao outro. Porém, como está escrito no meu post, soberania não se compartilha.

    Então, há que se escolher: quem está reinando no mundo?

    Para nós que conhecemos a Deus, é um consolo saber que o Senhor reina os céus e na terra.

    Em Cristo,

    Clóvis

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  10. Clóvis,

    comecei a ler seu blog a pouco tempo, tenho que dizer que gosto muito dos seus posts.
    Sempre que puder, e que meu conhecimento me permitir, tentarei participar.

    Em Cristo,

    Cauê

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  11. Cauê,

    Seja bem vindo. Suas participações enriquecerão os debates aqui desenvolvidos.

    Em Cristo

    Clóvis

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  12. Olá Clóvis,
    muito bom seu artigo. Já faz um certo tempo que observo a qualidade de seus artigos. Parabéns meu irmão. Tenho que publicá-lo no meu Blog rsrsrs. Tudo Ok? Inclusive, já tenho um texto seu por lá rsrsrs...
    Um abraço meu irmão.
    Eric.

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  13. Eric,

    Soli Deo Gloria. Todos os artigos do Cinco Solas são de distribuição livre, desde que mantido o conteúdo, citada a fonte e uso não comercial.

    Em Cristo,

    Clóvis

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  14. Clóvis, todas estas suas observações acho pertinentes e sempre mantenho para todas as publicações de outros Blogs. Sem problemas. Se pudesse dizer um sobrenome; para não ficar somente como autor Clóvis.
    Um abraço.
    O meu Blog é o http://outdoorteologico.blogspot.com/

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  15. Eric,

    Meu nome completo é Clóvis José Gonçalves, mas não faço questão do José. Vou visitar seu blog e se gostar incluí-lo na minha lista de blogs recomendados.

    Em Cristo,

    Clóvis

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  16. Eric,

    Bastou uma visita rápida para que o Outdoor Teológico fosse parar na minha lista.

    Em Cristo,

    Clóvis

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  17. Clóvis,
    muito obrigado pela visita e pelo fato dele fazer parte da sua lista. O seu Blog foi um dos que auxiliou-me na interpretação calvinista à época da minha transição doutrinária. Veja como Deus utiliza tudo ao Seu dispor.
    Um abraço meu irmão.
    Eric

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  18. Pelo q eu li do sinergismo arminiano ele não confirma o livre arbítrio...Trazem uma visão na qual há um sincretismo entre a predestinação e uma livre - gerencia,conforme podemos atestar nas seguintes palavras : O seu pensador traz em sua formulação que o homem é totalmente incapaz, até mesmo, de desejar se aproximar de Deus. Para Ele, a salvação é somente pela graça e por meio da fé. Mesmo para dar os primeiros passos em direção a Deus o homem precisa da graça preveniente, que foi tornada disponível a todos os homens graças à obra redentora de Jesus Cristo. Portanto, a participação do homem em sua própria salvação consiste apenas em não resistir a Deus. Todavia, nenhum homem nasce com essa capacidade de não resistir à Deus, já que todos nascem totalmente depravados, com sua natureza corrompida devido ao pecado de Adão. É a graça preveniente, outorgada por Deus a todos os homens, que restaura neles essa capacidade de escolherem a Deus, se quiserem.

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"Se amássemos mais a glória de Deus, se nos importássemos mais com o bem eterno das almas dos homens, não nos recusaríamos a nos engajar em uma controvérsia necessária, quando a verdade do evangelho estivesse em jogo. A ordenança apostólica é clara. Devemos “manter a verdade em amor", não sendo nem desleais no nosso amor, nem sem amor na nossa verdade, mas mantendo os dois em equilíbrio (...) A atividade apropriada aos cristãos professos que discordam uns dos outros não é a de ignorar, nem de esconder, nem mesmo minimizar suas diferenças, mas discuti-las." John Stott

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