Obama, onisciência e livre-arbítrio


Não costumo fazer comentários políticos neste blog. Nada contra política, até gosto. Mas reconheço que é uma área em que me saio melhor ficando calado. Por isso, nem mesmo a eleição do primeiro americano negro para a presidência dos EUA fez com que eu quebrasse meu silêncio. E a culpa por alguma bobagem que eu venha dizer é do Roger, do Teologia Livre, que fez uma leitura da eleição presidencial americana a partir da soberania divina e do livre-arbítrio. Então não resisti.

Segundo nosso querido irmão, se Deus já tem tudo planejado e conhece todo o futuro, então as eleições americanas foram apenas um passa-tempo. Mais, se o resultado das eleições estavam no plano de Deus, então Obama é o melhor candidato, mas se Deus se absteve de votar, então talvez o Obama não tenha sido a escolha certa. Entretanto, parece que o Roger prefere que o Obama tenha sido uma escolha divina. Eu também.

Alguns pontos merecem atenção cuidadosa nas palavras do Roger. Quando, por exemplo, ele diz "se Deus tem tudo planejado e conhece todo o futuro", parece admitir a possibilidade de que Deus não tem um plano e, mais grave, que Ele não conhece todo o futuro. Deus não ter um plano o torna menos sábio que qualquer homem prudente, na opinião de Jesus. Além disso, a Bíblia é clara que Deus tem um plano perfeito e infalível, e que o está executando nos mínimos detalhes.

Porém, causa-me estranheza que alguém avente a possibilidade de Deus não conhecer o futuro de forma exaustiva. A Bíblia é inquestionável ao afirmar a onisciência de Deus, e antes dos neoteístas ninguém que merecia ser levado a sério tinha ousado limitar o conhecimento divino de todas as coisas reais e possíveis (os socinianos e testemunhas de jeová não contam como sérios).

Qual a relação, se existe, entre o plano de Deus e seu conhecimento perfeito e a eleição de Obama?

Começando pelo conhecimento divino, por ser este exaustivo e perfeito, a eleição do Obama era certa. Vejamos, se Deus na eternidade passada anteviu Barack Obama sendo eleito em 2008, então era inevitável que este fizesse todos os votos que fez. Do contrário, Deus não passaria de um desses charlatões que anunciam a vitória de candidatos que muitas vezes desistem do pleito para evitar um fiasco maior. Então, se a vitória do Obama esteve sempre presente na mente de Deus, mesmo não tendo Ele entrado na cabine de votação nem feito campanha na TV, não havia jeito de Obama ser derrotado. Nós não sabíamos que Ele venceria, os institutos de pesquisas admitiam um erro amostral para suas previsões, mas a previsão de Deus tinha um nível de confiança de 100%, com margem de erro de zero pontos percentuais. E foi feita na eternidade passada!

Mas eu não creio apenas que Deus anteviu a vitória de Obama. Creio piamente que a vitória do descendente de queniano estava contemplada no plano divino. Sendo o plano de Deus eterno, todo abrangente e infalível, se o Obama ganhasse sem que fosse plano de Deus, então agora Ele estaria colocando em prática um plano B. Isso é indigno da pessoa divina!

Quais as implicações do fato da eleição do Obama ter sido tornada certa pelo conhecimento e pelo plano divino? Certamente o fato de Deus ter planejado que Obama ganhasse não significa que ele seja o melhor candidato, tome-se isso no sentido que se desejar. Na história de Israel e de suas nações vizinhas, o Senhor muitas vezes levantou ímpios, para servirem de vara pela qual Ele aplicava o Seu juízo. Faraó, Nabucodonozor e Ciro são alguns nomes a serem citados. Também não significa, como pensa o Roger, que se foi Deus que escolheu Obama, então foi para o bem dos EUA e do planeta. Deus algumas vezes levantou reis ímpios como forma de castigar a própria nação. Além disso, o bem dos EUA não anda de mãos dadas com o bem do restante do mundo.

Tampouco significa que os americanos não fizeram uma escolha real, se preferirem, não significa que tenham tido o seu livre-arbítrio para escolher o candidato de sua preferência tolhido. A festa nos Estados Unidos e no mundo demonstra que suas vontades não foram violentadas, muito embora não pudessem, estritamente falando, escolher diferentemente do que Deus havia planejado.

Finalmente, para aqueles que a esta altura estão pensando "para que votar, se de uma maneira ou de outra o Obama ia ganhar?", vai uma palavrinha de esclarecimento. O mesmo Deus que tornou certa a vitória de Obama, também tornou certos os meios que o levaram à Casa Branca: o voto voluntário de cada um de seus eleitores. Assim, da mesma forma que era inevitável que Obama ganhasse, era impossível que ele ganhasse sem os votos livres de cada um dos que confiaram a ele os rumos do país.

Quanto a mim, que há muito aprendeu a não se entusiasmar demais com os homens, estou muito feliz por ter visto um americano negro ser eleito presidente nos Estados Unidos e espero viver para ver um brasileiro negro no Palácio do Planalto.

Soli Deo Gloria

PS.: Não me referirei ao Barack Obama como afro-americano enquanto os demais presidentes não forem chamados de euro-americanos pela imprensa.

2 comentários:

  1. Caríssimo Clóvis,

    muito bem escrito seu Post.
    Pelo visto tivemos muitas coisas em comum relativas a esse acontecimento político tão importante.
    Fatalmente haveria alguns pontos divergentes, e você etá corretíssimo em abordá-los para esclarecer aquilo que é sua compreensão da fé e doutrina cristãs, de acordo com sua boa consciência e escrituras. Isso para mim só é uma demonstração de respeito e carinho por mim e nosso Blog.
    Futuramente, com calma, se Deus quiser, (se é que Ele já não queira) voltarei aqui para ver se me cabe algumas réplicas ou ressalva, as quais se houverem (o que geralmente é bem provável de existirem e pouco prováveis de serem admitidas rsrs) não me inibirei em publicar em nosso Blog.
    Por hora, obrigado pela distinção,
    abraços fraternos,
    Roger

    ResponderExcluir
  2. Muito bom Clóvis,
    Tô achando que teísmo aberto é pouco, estão descambando para o deísmo absoluto.

    Deus antigamente participava ativamente dos acontecimentos e todos celebravam sua soberania. Hoje, as "mentes brilhantes" o despojaram e colocaram o sentimentalismo para reinar. Deus passou a ser um mero expectador, isso claro, se não tiver ocupado demais pensando o que fazer no futuro ou daqui a pouco, uma vez que algum homem pode tomar uma decisão que atrapalhe completamente algum planinho divino.

    ResponderExcluir

"Se amássemos mais a glória de Deus, se nos importássemos mais com o bem eterno das almas dos homens, não nos recusaríamos a nos engajar em uma controvérsia necessária, quando a verdade do evangelho estivesse em jogo. A ordenança apostólica é clara. Devemos “manter a verdade em amor", não sendo nem desleais no nosso amor, nem sem amor na nossa verdade, mas mantendo os dois em equilíbrio (...) A atividade apropriada aos cristãos professos que discordam uns dos outros não é a de ignorar, nem de esconder, nem mesmo minimizar suas diferenças, mas discuti-las." John Stott

Sua leitura deste post muito me honrou. Fique à vontade para expressar suas críticas, sugestões, complemetos ou correções. A única exigência é que seja mantido o clima de respeito e cordialidade que caracteriza este blog.