Paulo descreve a salvação do indivíduo como já iniciada, mas ainda não completa. É então garantido que se completará? A pergunta é crítica e face de obstáculos apresentados por forças do mal que agora agem contra os desígnios de Deus, pela perseguição e pela tentação que ameaçam romper a continuidade da salvação e pela perspectiva do juízo final.
A questão da certeza da salvação final dos fiéis depende em parte da salvação ser totalmente obra de Deus ou também receber a contribuição de seres humanos. Para Paulo, a salvação é somente pela graça divina e assim é tão-somente obra de Deus. Os cristãos não têm nenhuma contribuição a fazer para a salvação, pois seu fracasso ao fazê-lo prejudicaria o resultado final. A ordem: “com temor e tremor ponde por obra a vossa salvação" (Fp 2:12) refere-se ao papel ativo dos fiéis baseado no fato de que (“pois”, gar) “é Deus quem opera em vós o querer e o fazer” (Fp 2:13). Essa total dependência de Deus inspira humildade e obediência (“temor e tremor”).
Além disso, Deus tenciona completar a salvação dos fiéis. Deus “os predestinou a serem conformes à imagem de Seu Filho” (Rm 8:29), “[os] escolheu desde o começo para [serem] salvos... [os] chamou... a possuir a glória de nosso Senhor Jesus Cristo” (2Ts 2:13-14) e “não [os] destinou a experimentar Sua ira, mas a possuir a salvação” (1Ts 5:9). Paulo descreve as iniciativas divinas na salvação dos cristãos como uma “corrente dourada” na qual cada elo subtende o anterior e carrega a promessa do que vem a seguir, sendo o último elo a glorificação (Rm 8:29-30). Paulo tem certeza que a intenção de Deus será realizada: “Aquele que começou em vós uma obra excelente [de salvação] prosseguirá em sua conclusão até o dia de Jesus Cristo” (Fp 1:6).
Como Paulo remonta a verdadeira fé cristã à eleição eterna de Deus, não à história humana arbitrária nem à vontade humana, ele expressa a certeza de que essa fé alcançará a sua meta final. Ele vê outra garantia da salvação final dos fiéis na dádiva do Espírito. Este Espírito é o “Espírito prometido, o Espírito Santo” (Ef 1:13), o “Espírito dAquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos” (Rm 8:11), o “Espírito que dá a vida” (Rm 8:2). Paulo descreve esse poder divino de nova vida escatológica e esperança que habita os cristãos (cf. Rm 5:5; Tt 3:5) com a metáfora das primícias (Rm 8:23), do “adiantamento da nossa herança” (Ef 1:14; 2Co 1:22; 5:5) e do “sinete” (Ef 1:13; 4:30; 2Co 1:22). Por causa da ligação integral entre as primícias e o todo, a dádiva das primícias da salvação opera como promessa de que se seguirá a plenitude da salvação. Assim como o adiantamento obriga o doador ao pagamento total, o Espírito garante que Deus redimirá plenamente os cristãos, que são propriedades de Deus. Paulo faz trocadilho com a antiga função do sinete quando diz que os cristãos “estão marcados com o sinete do Espírito prometido [para o dia da redenção]”, o que significa que pertencem a Deus e estão sob a proteção de Deus com o propósito da salvação final.
Essas garantias da salvação final são, às vezes, consideradas referentes à igreja como um todo e não ao indivíduo; nesse caso, as garantias não eliminam a possibilidade de alguns perderem a salvação. Por outro lado, é o indivíduo que se beneficia com a obra salvífica de Deus – sendo chamado à fé, justificado, habitado pelo Espírito e, finalmente, glorificado – sendo assim, o que está predestinado a obter garantias dessas ações divinas. A audaciosa formulação de Paulo em Romanos 8:29-30 sugere que a obra salvífica de Deus continuará até estar completa em todos aqueles nos quais começou.
J. M. Gndry-Volf
In: Dicionário de Paulo e suas cartas, p. 115
SEJA O PRIMEIRO A
Postar um comentário
"Se amássemos mais a glória de Deus, se nos importássemos mais com o bem eterno das almas dos homens, não nos recusaríamos a nos engajar em uma controvérsia necessária, quando a verdade do evangelho estivesse em jogo. A ordenança apostólica é clara. Devemos “manter a verdade em amor", não sendo nem desleais no nosso amor, nem sem amor na nossa verdade, mas mantendo os dois em equilíbrio (...) A atividade apropriada aos cristãos professos que discordam uns dos outros não é a de ignorar, nem de esconder, nem mesmo minimizar suas diferenças, mas discuti-las." John Stott
Sua leitura deste post muito me honrou. Fique à vontade para expressar suas críticas, sugestões, complemetos ou correções. A única exigência é que seja mantido o clima de respeito e cordialidade que caracteriza este blog.