O blog Cinco Solas procurou saber a opinião de Jacó Armínio sobre a polêmica envolvendo uma palestra que seria proferida por Augustus Nicodemus numa loja da CPAD, principalmente sobre a atitude e a forma como as diferenças entre calvinistas e pentecostais tem sido tratadas. As respostas do famoso teólogo não foram editadas, apenas arranjadas na ordem em que as perguntas foram feitas.
Cinco Solas: Recentemente, a MegaStore da CPAD, convidou o Rev. Augustus Nicodemus Lopes para uma palestra. Houve uma grande agitação e a CPAD voltou atrás, cancelando de última hora o evento. O episódio pôs em realce a divisão entre calvinistas e pentecostais. Como o senhor vê toda essa situação?
Jacó Armínio: Não consigo dispersar a intensa tristeza que sinto em meu coração, devido àquela discórdia religiosa que tem irrompido, como uma gangrena. Deste sentimento verdadeiro de profunda angústia, penso que todos os que amam a Cristo e à sua Igreja compartilharão comigo. Este foi o motivo que me incitou a apresentar algumas observações a respeito das dissensões religiosas no mundo cristão.
CS: Alguns que defendem a separação comemoraram o cancelamento como uma vitória. O senhor compartilha desse sentimento?
JA: Nenhuma discórdia é mais chocante e odiosa que a discórdia na religião. A união da verdadeira religião é, portanto, da maior excelência.
CS: Parece, então, o senhor não compartilha do entusiasmo dos que comemoram em seu nome?
JA: Inimizades e dissensões do coração e dos sentimentos se disseminam e se tornam cismas, facções e separações em diferentes grupos. Pois da mesma maneira como o amor é um sentimento de união, o ódio é um sentimento de separação. Assim, sinagogas são erigidas, consagradas e cheias de pessoas, em oposição a outras sinagogas; igrejas, contra outras igrejas; e altares contra altares, quando nenhum dos grupos deseja ter qualquer relacionamento com o outro. Esta também é a razão por que com frequência ouvimos expressões completamente similares àquelas que ecoavam, clamorosamente, em meio à multidão congregada dos filhos de Israel, quando estavam se separando em grupos — "Que parte temos nós com Davi? Não há para nós herança no filho de Jessé. Às tuas tendas, ó Israel!" (1 RS 12.16), como se tivessem concluído anteriormente que o nome de Israel, por meio do qual Deus se dirige, de uma maneira extremamente misericordiosa, a toda a sua Igreja, não pudesse abranger, em seu abraço, pessoas que divirjam, em qualquer ponto, dos seus irmãos.
CS: O senhor tomou conhecimento dos ataques sofridos pelo jovem assembleiano, Gutierrez Fernandes, que se manifestou em favor da unidade?
JA: Na verdade, a luta acontece com uma obstinação tão determinada, que mal se consegue suportar aquele que, por um momento, suspende as mútuas animosidades com uma menção de paz, a menos que tenha colocado uma corda ao redor de seu pescoço e esteja preparado para ser suspendido, por essa corda, em uma forca, caso as suas palavras sobre este tema desagradem aos demais. Pois esse amigo da paz seria estigmatizado como um desertor da causa comum, e considerado culpado de heresia, um favorecedor de hereges, um apóstata e um traidor.
CS: Havia uma ameaça real ao pentecostalismo ou fizeram tempestade em copo d’água?
JA: Os males que enumeramos não apenas procedem de dissensões reais, em que alguma verdade fundamental é o assunto de discussão, mas também das que são imaginárias, quando coisas afetam a mente, não como são, na realidade, mas como parecem ser. Eu as chamo de dissensões imaginárias, porque existem entre grupos que têm apenas uma religião fabulosa, que está tão distante do Verdadeiro como o céu está distante da terra, ou como os seguidores de tal fantasma estão distantes do próprio Deus. Os grupos discordantes imaginam que essas diferenças imaginárias estão na essência da verdadeira doutrina, quando não têm nenhuma existência. Esta é a natureza da discórdia, ou seja, dispersar e destruir assuntos da maior consequência.
CS: A polêmica toda ocorreu num fórum público. Em que isso pode afetar um observador de fora, que está se interessando pela fé cristã?
JA: Da força dessa dissensão na mente dos homens, surge certa incerteza duvidosa, a respeito da religião. O resultado pode ser uma opinião muito perversa a respeito de toda a religião, uma total rejeição a todo tipo de religião, ou o ateísmo.
CS: Voltando à polêmica em si, pela sua experiência, quais são as causas desse sectarismo?
JA: À frente delas, aparece Satanás, aquele mais amargo inimigo da verdade e da paz, e o mais infame disseminador de falsidade e dissensão, que age como líder do grupo hostil. O próprio homem vem a seguir, nesse séquito destrutivo, e é facilmente persuadido a realizar qualquer serviço para Satanás, pois por mais perniciosa que a sua operação prove ser, para a sua própria destruição, e esse sutil inimigo, a serpente, encontra, no homem, vários instrumentos apropriadamente adequados para a realização de seus propósitos. Que o ódio apareça agora, e nos exiba seus atos, que, pela própria natureza da causa, têm uma tendência própria e direta de incitar discórdia. O primeiro de seus atores a aparecer no palco é o ódio pela verdade e pela doutrina verdadeira. A seguir, vem o ódio pela paz e pela concórdia. Pois há homens de certa descrição que não podem existir sem ter um inimigo. O último a aparecer é o ódio contra os que professam a verdadeira doutrina, que decai, rapidamente, a uma dissensão daquela doutrina que professam esses bons homens; porque é o desejo ansioso de cada pessoa que odeia outra, não ter nada em comum com o seu adversário.
CS: Receio que os promotores discordem disso. Eles afirmam que estão defendendo a fé histórica da igreja, conforme entendida pelos pioneiros e professores da denominação.
JA: A opinião pré-concebida que formamos a respeito de nossos pais e antepassados também impede a reconciliação, porque que seria improvável que eles pudessem ser culpados de erros, ou porque concebemos esperanças favoráveis de sua salvação, e parecemos questionar essas esperanças se, em uma opinião oposta à deles, reconhecermos qualquer porção da verdade a respeito da salvação, da qual eles tenham sido ignorantes ou tenham desaprovado. Além disso, o esplendor da Igreja, à qual nos ligamos, por um juramento, ofusca nossos olhos, de tal maneira, que não podemos admitir qualquer persuasão que nos leve a crer na possibilidade, em tempos antigos ou atuais, de que essa igreja tenha sido desviada, em algum ponto, do caminho correto. Por fim, os nossos pensamentos e sentimentos a respeito de nós mesmos e nossos professores são tão exaltados, que nossa mente mal consegue conceber ser possível que eles tenham sido ignorantes ou não tenham tido uma percepção suficientemente clara das coisas, ou que erremos em julgamento, quando aprovamos as opiniões deles.
CS: O pivô involuntário de toda essa barulheira foi o Rev. Augustus Nicodemus Lopes, pela sua posição cessacionista e calvinista. O que o senhor tem a dizer sobre a forma como ele foi tratado pelos que o consideram um adversário?
JA: Um adversário é tratado de uma maneira perversa quando é sobrecarregado de maldições e repreensões, atacado com difamações e calúnias, e quando é ameaçado com ameaças de violência. E aqueles que usam armas desse tipo revelam, abertamente, a fraqueza e a injustiça de sua causa; não é muito provável que essas pessoas sejam instruídas pelo Espírito da verdade.
CS: Interessante esse ponto. O que mais poderia acrescentar sobre esse modus operandi?
JA: A contenda é cruelmente instituída contra a opinião de um adversário, em primeiro lugar, quando ela não é proposta segundo a mente e a opinião daquele que a declara; em segundo lugar, quando é discutida além de todos os limites devidos e a sua deformidade é inoportunamente exagerada; e, por fim, quando a sua refutação é proposta por argumentos mal calculados para produzir esse efeito.
CS: Qual é o seu conselho para que episódios como esse não se repitam?
JA: Que sejam deixadas de lado aquelas causas que, como afirmamos anteriormente, têm a sua origem nos afetos e que não apenas instigam essa dissensão, como tendem a perpetuá-la e a mantê-la viva. Que a humildade vença a soberba; que a mente que esteja satisfeita com a sua condição se torne a sucessora da avareza; que o amor pelos deleites celestiais expulse todos os prazeres carnais; que a boa vontade e a benevolência ocupem o lugar da inveja; que a paciente tolerância subjugue a ira; que a sobriedade na aquisição da sabedoria prescreva limites para o desejo do conhecimento, e que a estudiosa aplicação ocupe o lugar da ignorância instruída. Que sejam deixados de lado todo o ódio e amargura; e, ao contrário, "nos revistamos de entranhas de misericórdia" (Cl 3.12), para com aqueles que diferem de nós e que parecem vagar pelos caminhos do erro ou espalhar as suas sementes repugnantes entre os outros.
CS: Algo mais?
JA: Que seja acrescentada uma consideração de todos aqueles artigos da religião, a cujo respeito existe, dos dois lados, uma perfeita concordância. Talvez descubramos que são tão numerosos e de tão grande importância que, quando for feita uma comparação entre eles e outros que podem se tornar tema de controvérsia, os últimos serão poucos em número, e de pouca consequência. E é meu desejo especial que haja entre nós, agora, uma cessação similar das asperezas da guerra religiosa, e que os dois grupos se abstenham de textos cheios de amargura, de sermões notáveis apenas pelas ofensas que contêm, e da prática nada cristã de excomungar e execrar. Em lugar de tudo isso, que os adeptos de controvérsias substituam os textos por escritos cheios de moderação, em que as questões controversas possam, sem acepção de pessoas, ser claramente explicadas e provadas, por argumentos convincentes.
Soli Deo Gloria
PS.: As falas de Jacó Armínio foram extraídas de seu discurso Sobre a Reconciliação de Dissensões Religiosas entre Cristãos, in Obras de Armínio, Volume I, CPAD.
Excelente "entrevista". Nao duvido que essas possivelmente seriam suas palavras de estivesse entre nós. Parabéns ao "cinco solas"!
ResponderExcluirAs palavras são realmente dele, extraídas de uma palestra dele sobre dissenções religiosas entre cristãos.
ExcluirEntendi a intenção, mas não curto necromancia rsrs
ResponderExcluirSilvana,
ExcluirNão é necromancia. As palavras são realmente dele, extraídas de uma palestra dele sobre dissenções religiosas entre cristãos.
Entendi a intenção, mas não curto necromancia rsrs
ResponderExcluirSimplesmente porque porque você não conhece história e muito menos unidade da igreja. João 17 Leia, ore e decore.
ExcluirDizem que Saul uma vez tentou isso...
ResponderExcluirO que Saul fez foi consultar uma necromante. Eu apenas utilizei palavras ditas e escritas por Armínio.
ExcluirClóvis está perfeito esse texto e a analogia à uma entrevista por Armínio. Não tem nada de necromancia, o que pode estar passando por estado necro é a mente e intenção de pessoas que insistem em manter a mente fechada.
ExcluirNa boa.... vcs são inteligentes e sabem escrever um bom artigo. Por que não "O que Jacó Arminio diria sobre...". Fica a dica para a próxima, ok?
ResponderExcluirMãe, to no Bibotalk
ExcluirAh, se os arminianos ouvissem (lessem) mais Armínio.
ResponderExcluirComo tem gente chata que não sabe nem levar na brincadeira uma simples brincadeira!
ResponderExcluirIrmãos, posso postar em uma página do facebook?
ResponderExcluirFique à vontade, mano.
ExcluirIrmão Clovis Gonçalves, seria possível postar está entrevista no meu blog. Com suas devidas considerações
ResponderExcluirÀ vontade, irmão.
ExcluirSeria bom perguntar, que diria Calvino?????
ResponderExcluirE se fosse o contrário? Na verdade jamais haveria a possibilidade contrária. Uma editora de linha Reformada Calvinista jamais convidaria um escritor Pentecostal para um evento.
ResponderExcluirVocê tem certeza disso, eterno aprendizes? Eu não tenho tanta.
ExcluirMuito bom o texto. É interessante perceber como cristãos equilibrados podem aproveitar algo de teologos de linha doutrinária divergente...
ResponderExcluirDa mesma forma como o autor deste texto, sendo calvinista foi buscar algo positivo em Arminius, os pentecostais (não todos) deveriam abrir um pouco mais sua mente para aprender algo com a fé reformada.
Se acredito que uma editora ou evento de linha reformada convidaria um pentecostal para falar,creio que sim, com certeza a escolha seria bem criteriosa. Lógico! Com certeza a CPAD escolheu com muito criterio o Rev. Augustus, e foi feliz na escolha, diferentemente do nivel a que desceu ao cancelar o evento. Mas enfim situaćão dificil pra eles.
Basta ver o exemplo das Conferências Fiel. Alí temos Presbiterianos e Batistas, credobatistas e pedobatistas (que é um debate tão sério quanto pentecoatais e cessacionistas), amilenistas e pre-premilenistas (sério tambem).
Veja por exemplo John Piper, é um batista reformado, bem calvinista, porém é continuísta, crê na validade dos dons para hoje, inclusive linguas... mas ele é muito bem vindo na Fiel, na universidade Mackenzie onde ja pregou várias vezes.
Ainda não ví um arminiano, porém vejo muitos pregadores reformados, famosos, citarem positivamente, concordando em muitas coisas com arminianos como Leonard Havenhill (o Paul Washer gosta muito dele), David Wilkerson (que era bem pentecostal), C.S. Lewis etc... creio que caras como esses só não são chamados porque Deus já os chamou para o céu...
Porque oa arminianos que estão por ai nas midias,radio, internet, não fazem isso com mais frequencia???
Rev. Hernandes cita Lewis, Ravenhill etc. Muito pouco o vejo citar Calvino. Então o apreço por bons arminianos no meio calvinista é grande.
Mas por que os arminianos ou pentecostais nem tentam em sua maioria, ler As Institutas de Calvino, nem que seja pra criticar depois, mas tenta, nem mesmo nós reformados concordamos com tudo o que está escrito lá...
Os pentecostais talvez iriam se surpreender: Calvino falou mais do Espirito Santo do que de predestinação! Seu poder transformador, salvifico etc...
Mas por que não fazem? Tem medo de mudar de opinião? Eu leio autores arminianos e pentecoatais o tempo todo e não tenho esse medo!
Ja mudei de opinião em muitas coisas. Eu era dispensacionalista clássico, mas algora estou me reformando... alguns irmãos, como um tio da minha esposa (que é pastor presbiteriano) dizem que sou reformado, mas ainda acho que estou no caminho... mas isso não quer dizer que você tem a obrigação de mudar.
Sola gratia!
P.s: Favor desconsiderar os erros difitação... (celular pequeno para dedos grandes rsrsrsrs)
Alisson,
ExcluirA igreja perde quando por detalhes (importantes mas não essenciais) deixamos de dar ouvidos e de falar com quem é parte da igreja e pode contribuir para o crescimento dela.
Eu discordo de Armínio em mais pontos do que discorde de Calvino, mas não deixa de tirar proveito da leitura de um e de outro.
Em Cristo,
De fato, existem detalhes ou informações que são importantes, mas são secundárias... são importantes, e devemos nos posicionar sobre elas. Porém o extremismo quanto a isso leva ao sectarismo. Os únicos critérios para divisão deveriam ser os itens fundamentais da fé que distinguem o Cristianismo das outras religiões.
Excluir