Os sacramentos da Igreja

Os sacramentos (são) adicionais à Palavra e o que são eles. Deus, desde o princípio, acrescentou à pregação da Palavra em sua Igreja os sacramentos ou sinais sacramentais. É o que a Sagrada Escritura claramente testifica. Sacramentos são símbolos místicos, ou ritos santos, ou atos sagrados instituídos pelo próprio Deus, consistindo segundo a sua Palavra, de sinais e de coisas significadas, por meio das quais ele, na Igreja, conserva a memória dos grandes benefícios por ele concedidos ao homem - renovando-a freqüentemente - por meio dos quais, também, ele sela as suas promessas e, externamente as representa e, como que nos põe diante dos olhos aquelas coisas que internamente ele nos concede, e assim fortalece e aumenta a nossa fé pela operação do Espírito de Deus em nossos corações. Finalmente, por meio deles, ele nos separa de todos os outros povos e religiões, e nos consagra e nos liga a si só, e nos dá a entender o que ele requer de nós.

Alguns são sacramentos do Velho, outros do Novo Testamento. Alguns sacramentos são do velho povo, outros do novo. Os sacramentos do velho povo eram a Circuncisão e o Cordeiro Pascal, que era imolado; por essa razão, ele se relaciona com os sacrifícios celebrados desde o princípio do mundo.

O número dos sacramentos do novo povo. Os sacramentos do novo povo são o Batismo e a Ceia do Senhor. Alguns há que reconhecem sete sacramentos do novo povo. Destes, reconhecemos que o arrependimento, a ordenação de ministros - não a ordenação papista, mas a apostólica - e o matrimônio são instituições úteis de Deus, não porém sacramentos. A confirmação e a extrema unção são simples invenções dos homens, que a Igreja pode dispensar sem nenhum prejuízo. Na verdade, não as temos em nossas igrejas, pois elas contêm certas coisas que de modo nenhum podemos aprovar. Acima de tudo, detestamos todo o comércio que exercem os romanistas na dispensação dos sacramentos.

O autor dos sacramentos. O autor de todos os sacramentos não é nenhum homem, mas Deus somente. Os homens não podem instituir sacramentos. Estes fazem parte do culto de Deus. E não é da competência do homem estabelecer e prescrever o culto de Deus, mas receber e preservar o que por Deus foi entregue. Além disso, os símbolos têm juntas as promessas que requerem fé. E a fé se apóia exclusivamente na Palavra de Deus; e a Palavra de Deus assemelha-se a escritos ou cartas, e os sacramentos a selos, que somente Deus coloca nas cartas.

Cristo ainda opera nos sacramentos. E sendo Deus o autor dos sacramentos, assim ele continuamente opera na Igreja, em que os sacramentos são devidamente celebrados; de modo que os fiéis, quando recebem dos ministros os sacramentos, reconhecem que Deus opera em sua própria instituição, e portanto, recebem os sacramentos como da mão do próprio Deus; e os defeitos do ministro (ainda que sejam muito grandes) não podem prejudicá-lo, se eles reconhecem que a integridade dos sacramentos depende da instituição do Senhor.

Deve-se distinguir entre o autor e o ministro dos sacramentos. Por conseguinte, na administração dos sacramentos distinguem eles, também claramente, entre o Senhor mesmo e o ministro do Senhor, confessando que a substância dos sacramentos lhes é dada pelo próprio Senhor e os símbolos pelos ministros do Senhor.

A essência ou coisa principal nos sacramentos. Mas, a coisa principal que Deus propõe em todos os sacramentos e para a qual todos os piedosos de todos os tempos voltam a atenção que outros chamam substância e matéria nos sacramentos é Cristo o Salvador, o sacrifício único, o Cordeiro de Deus morto desde a fundação do mundo, a rocha, também, da qual todos os nossos pais beberam, por quem todos os eleitos são circuncidados não por mãos, pelo Espírito Santo, e são lavados de todos os seus pecados e alimentados com o próprio corpo e sangue de Cristo para a vida eterna.

Semelhança e diferença dos sacramentos do velho e do novo povo de Deus. Com respeito ao que é o principal e a própria matéria, os sacramentos de ambos os povos são iguais. Pois Cristo, o único Salvador e Mediador dos fiéis, é o principal elemento e a própria substância dos sacramentos em ambos; porquanto o mesmo Deus é o autor dos dois sacramentos.

Eles foram dados aos dois povos como sinais e selos da graça e das promessas de Deus, para que tragam à mente e renovem a lembrança dos grandíssimos benefícios de Deus e para que distinguissem os fiéis de todas as outras religiões do mundo; finalmente, para que fossem recebidos espiritualmente pela fé e ligassem à Igreja os participantes, e os lembrassem dos seus deveres. Nesses e em outros pontos semelhantes digo que os sacramentos de ambos os povos não são diferentes como parecem, embora exteriormente o sejam. E, na verdade. no que diz respeito aos sinais, fazemos uma maior distinção. Os nossos são mais firmes e mais duradouros, visto que nunca serão mudados até o fim do mundo. Mais ainda, os nossos testificam que tanto a substância como a promessa foram cumpridas ou consumadas em Cristo; os anteriores significavam o que estava para ser cumprido. Os nossos são também, mais simples e menos complicados, menos pomposos e menos envolvidos com cerimônias. E ainda mais, pertencem a um povo mais numeroso, disperso por toda a face da terra. E, porque são mais excelentes e pelo Espírito Santo despertam maior fé, resultam ainda, em maior abundância do Espírito.

Nossos sacramentos sucedem aos antigos, que foram abolidos. Certamente, visto que Cristo, o verdadeiro Messias, nos é apresentado e a abundância da graça é derramada sobre o povo do Novo Testamento, os sacramentos do velho povo de Deus foram abolidos e cessaram; e em seu lugar colocaram-se os símbolos do Novo Testamento - o Batismo em lugar da Circuncisão, a Ceia do Senhor em lugar do Cordeiro Pascal e dos sacrifícios.

Em que consistem os sacramentos. E como outrora os sacramentos consistiam da palavra, do sinal e da coisa significada, assim também agora eles se compõem, por assim dizer, dessas mesmas partes. Pois, a Palavra de Deus os faz sacramentos, o que antes não eram. A consagração dos sacramentos. São consagrados pela Palavra e declarados santificados por aquele que os instituiu. Santificar ou consagrar uma coisa a Deus é dedicá-la a usos sagrados isto é, retirá-la do uso comum ou profano e destiná-la a uso sagrado, pois, os sinais nos sacramentos se derivam do uso comum, de coisas externas e visíveis. No Batismo, o sinal externo é o elemento da água e a ablução visível, feita pelo ministro; a coisa significada é a regeneração e purificação de pecados. Na Ceia do Senhor, o sinal externo é o pão e o vinho, tomados do uso comum do comer e do beber; a coisa significado é o corpo do Senhor que foi entregue, e seu sangue vertido por nós, ou a comunhão do corpo e do sangue do Senhor. Por isso, a água, o pão, o vinho, segundo sua natureza e à parte da instituição divina e do uso sagrado, são somente aquilo que são chamados, e que experimentamos. Mas, quando a Palavra do Senhor lhes é acrescentada, com a invocação do nome divino e a renovação de sua primeira instituição e santificação, então esses sinais são consagrados e se mostram santificados por Cristo. A primeira instituição de Cristo e a consagração dos sacramentos permanece sempre eficaz na Igreja de Deus, de tal modo que aqueles que celebram os sacramentos, não de modo diferente daquele que o Senhor mesmo estabeleceu desde o princípio, ainda hoje desfrutam daquela primeira e sobre-excelente consagração. E por isso, na celebração dos sacramentos, são repetidas as próprias palavras de Cristo.

Os sinais recebem o nome das coisas significadas. Porque aprendemos da Palavra de Deus que estes sinais foram instituídos para outro fim, diverso do uso comum, ensinamos que eles agora, em seu santo uso, assumem em si os nomes das coisas significados e não são mais chamados apenas água, pão ou vinho, mas também, regeneração ou o lavar com água e o corpo e sangue do Senhor, ou símbolos e sacramentos do corpo e sangue do Senhor. Não que os símbolos se transformem nas coisas significados ou cessem de ser o que são por sua natureza. Pois de outro modo não poderiam ser sacramentos. Se fossem apenas a coisa significado, não seriam sinais.

A união sacramental. Portanto, os sinais adquirem os nomes das coisas, porque são símbolos místicos de coisas sagradas, e porque os sinais e as coisas significados estão sacramentalmente ligados; ligam-se, digo, ou unem-se pela significação mística e pela vontade e conselho daquele que instituiu os sacramentos. A água, o pão e o vinho não são sinais comuns, mas sagrados. E aquele que instituiu a água no batismo não a instituiu com a vontade e intenção de que os fiéis apenas fossem aspergidos pela água do batismo; e aquele que mandou comer o pão e beber o vinho na ceia não queria que os fiéis recebessem apenas pão e vinho sem qualquer mistério, da maneira como comem pão em suas casas, mas, que participassem espiritualmente das coisas significados, sendo pela fé verdadeiramente lavados de seus pecados e participantes de Cristo.

As seitas. Portanto, não podemos absolutamente aprovar os que atribuem a santificação dos sacramentos a não sei que propriedades e fórmulas ou ao poder de palavras pronunciadas por alguém que é consagrado e o que tem a intenção de consagrar, ou por outros acidentes quaisquer, que nem Cristo nem os apóstolos nos entregaram por palavras ou exemplo. Nem aprovamos tampouco a doutrina daqueles que falam dos sacramentos apenas como sinais comuns, não santificados nem eficazes. Nem aprovamos os que desprezam o aspecto visível dos sacramentos por causa do invisível, e assim crêem que os sinais são supérfluos porque pensam que já gozam as próprias coisas significados, como dizem que os messalianos sustentavam.

A coisa significada não está incluída nos sacramentos nem a eles ligada. Não aprovamos a doutrina daqueles que ensinam que a graça e as coisas significadas estão de tal modo ligadas aos sinais e neles incluídas que, todos aqueles que participarem externamente dos sinais, não importando que espécie de pessoas sejam, são também interiormente participantes da graça e das coisas significados.

No entanto, como não julgamos o valor dos sacramentos pela dignidade ou indignidade dos ministros, assim também não os avaliamos pela condição daqueles que os recebem. Pois, sabemos que o valor dos sacramentos depende da fé e da veracidade e exclusiva bondade de Deus. Assim como a Palavra de Deus permanece a verdadeira Palavra de Deus que, em sendo pregada, não são meras palavras repetidas, mas ao mesmo tempo, as coisas significadas ou anunciadas em palavras são oferecidas por Deus, embora os ímpios e incrédulos as ouçam e compreendam, contudo não aproveitam as coisas significadas, porque não as recebem pela verdadeira fé, assim os sacramentos, que pela Palavra consistem de sinais e de coisas significadas, continuam sendo sacramentos verdadeiros e invioláveis, significando não somente coisas sagradas mas, pelo oferecimento de Deus, as próprias coisas significadas, embora os incrédulos não percebam as coisas oferecidas. Neste caso, a culpa não é de Deus que as dá e as oferece, mas dos homens que as recebem sem fé e de modo ilegítimo, cuja incredulidade, porém, não invalida a fidelidade de Deus (Rom 3.3 ss).

O fim para o qual os sacramentos foram instituídos. Desde que o fim para o qual os sacramentos foram instituídos foi também explanado, de passagem, quando logo no começo de nossa exposição se mostrou o que eles são, não há necessidade de se fazer a repetição molesta daquilo que já foi dito. Conseqüentemente, portanto, falaremos agora, separadamente, dos sacramentos do novo povo.

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"Se amássemos mais a glória de Deus, se nos importássemos mais com o bem eterno das almas dos homens, não nos recusaríamos a nos engajar em uma controvérsia necessária, quando a verdade do evangelho estivesse em jogo. A ordenança apostólica é clara. Devemos “manter a verdade em amor", não sendo nem desleais no nosso amor, nem sem amor na nossa verdade, mas mantendo os dois em equilíbrio (...) A atividade apropriada aos cristãos professos que discordam uns dos outros não é a de ignorar, nem de esconder, nem mesmo minimizar suas diferenças, mas discuti-las." John Stott

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