Deus usa ministros na edificação da Igreja. Deus sempre usou ministros para reunir ou estabelecer para si a Igreja, e para o governo e preservação da mesma; e ainda os usa e sempre os usará, enquanto a Igreja permanecer na terra. Portanto, a origem, a instituição e o ofício de ministros é uma ordenação muito antiga de Deus mesmo e não inovação de homens. Instituição e origem de ministros. É verdade que Deus poderia, pelo seu poder, sem qualquer meio, congregar para si mesmo uma Igreja de entre os homens; mas ele preferiu tratar com os homens pelo ministério de homens. Por isso os ministros devem ser considerados não como ministros apenas por si mesmos, mas como ministros de Deus, visto que por meio deles Deus realiza a salvação de homens.
O ministério não deve ser depreciado. Por essa razão, chamamos a atenção dos homens para que tomem cuidado para não atribuirmos o que diz respeito à nossa conversão e instrução ao poder secreto do Espírito Santo, fazendo pouco do ministério eclesiástico. Pois convém termos sempre em mente as palavras do apóstolo: “Como, porém, invocarão aquele em que não creram? e como crerão naquele de quem nada ouviram? e como ouvirão, se não há quem pregue? ... E assim, a fé vem pela pregação e a pregação pela palavra de Cristo” (Rom 10.14, 17). E também o que o Senhor disse no Evangelho: “Em verdade, em verdade vos digo: Quem recebe aquele que eu enviar, a mim me recebe; e quem me recebe, recebe aquele que me enviou” (João 13.20). De igual modo, um homem da Macedônia, que apareceu numa visão a São Paulo, enquanto este se encontrava na Ásia, secretamente o admoestou dizendo: “Passa à Macedônia, e ajuda-nos” (At 16.9). E em outro lugar o mesmo apóstolo diz: “Porque de Deus somos cooperadores; lavoura de Deus, edifício de Deus sois vós” (I Co 3.9).
Por outro lado, no entanto, devemos precaver-nos para não atribuirmos demasiado aos ministros e ao ministério; aqui também lembrando-nos das palavras de nosso Senhor no Evangelho: “Ninguém pode vir a mim se o Pai que me enviou não o trouxer” (João 6.44), e as palavras do apóstolo: “Quem é Apolo? e quem é Paulo? Servos por meio de quem crestes, e isto conforme o Senhor concedeu a cada um ... Eu plantei, Apolo regou; mas o crescimento veio de Deus. De modo que nem o que planta é alguma cousa, nem o que rega, mas Deus que dá o crescimento” (I Co 3. 5, 7). Deus move os corações dos homens. Então, creiamos que Deus nos ensina pela sua palavra, externamente por meio dos seus ministros e internamente move os corações dos seus eleitos à fé pelo seu Espírito Santo; e que, portanto, devemos atribuir a Deus toda a glória de todo este benefício. Mas deste assunto já tratamos no primeiro capítulo desta Explanação.
Quem são os ministros e de que sorte são os que Deus deu ao mundo. E em verdade desde o princípio do mundo Deus usou os mais eminentes homens no mundo inteiro (ainda que muitos deles fossem simples na sabedoria terrena ou na filosofia, no entanto na verdadeira teologia eram excelentes), a saber, os patriarcas, com os quais ele falou freqüentemente pelos anjos. Pois os patriarcas eram os profetas e mestres dos seus dias, aos quais, por essa razão, quis Deus que vivessem por vários séculos, para que fossem, por assim dizer pais e luzes do mundo. Foram seguidos por Moisés e os profetas famosos pelo mundo inteiro.
Cristo o mestre. Depois destes o Pai celestial enviou o seu Filho unigênito, o mais perfeito mestre do mundo, em quem está escondida a sabedoria de Deus, a qual veio até nós através da mais santa, simples e perfeita de todas as doutrinas. Ele escolheu discípulos para si mesmo, aos quais fez apóstolos. Estes saíram por todo o mundo e em toda parte congregaram igrejas pela pregação do Evangelho, e depois ordenaram pastores ou mestres (doutores) em todas as igrejas do mundo, segundo o mandamento de Cristo; mediante seus sucessores ele ensinou e governou a Igreja até hoje. Portanto, como Deus deu ao seu povo antigo os patriarcas, juntamente com Moisés e os profetas, assim também ao seu povo do Novo Testamento ele enviou seu Filho unigênito e, com ele, os apóstolos e doutores da Igreja.
Ministros do Novo Testamento. Além disso, os ministros do novo povo são designados por diversos nomes. São chamados apóstolos, Profetas, evangelistas, bispos, anciãos, pastores e mestres (I Co 12.28; Ef 4.11). Os apóstolos. Os apóstolos não permaneciam num lugar determinado, mas por todo o mundo iam congregando diversas igrejas. Uma vez estas estabelecidos, deixou de haver apóstolos, e, em seu lugar, apareceram pastores, cada um em sua igreja. Profetas. Nos primeiros tempos eram videntes, conhecendo o futuro; mas também interpretavam as Escrituras. Tais homens são encontrados também hoje. Evangelistas. Os escritores da história evangélica eram chamados Evangelistas; mas eram também arautos do Evangelho de Cristo; como o apóstolo São Paulo ordena a Timóteo: “Faze o trabalho de evangelista” (II Tim 4.5). Bispos. Bispos são os supervisores e vigias da Igreja, que administram o alimento e outras necessidades da vida da Igreja. Presbíteros. Os presbíteros são os anciãos e, por assim dizer, os senadores e pais da Igreja, governando-a com sadio conselho. Pastores. Os pastores não só guardam o rebanho do Senhor, como também providenciam as coisas necessárias a ele. Mestres. Os mestres instruem e ensinam a verdadeira fé e piedade. Portanto, os ministros da Igreja podem, agora, ser chamados bispos, anciãos, pastores e mestres.
Ordens dos papistas. Com o passar o tempo, muitas outras designações de ministros na Igreja foram introduzidas na Igreja de Deus. Alguns foram ordenados patriarcas, outros arcebispos, outros sufragâneos; também metropolitanos, arquidiáconos, diáconos, subdiáconos, acólitos, exorcismas, cantores, porteiros e não sei quantos outros, como cardeais, reitores e priores; abades maiores e menores; ordens mais elevadas e inferiores. Não estamos preocupados, porém, acerca de todas estas, de como foram uma vez e são agora. Basta-nos a doutrina apostólica no que concerne aos ministros.
A respeito dos monges. Como sabemos com certeza que os monges e as ordens, ou seitas de monges, não são instituídas nem por Cristo, nem pelos apóstolos, ensinamos que elas nada valem para a Igreja de Deus; antes são perniciosas. Pois, embora anteriormente fossem toleráveis - quando eram solitários, ganhando a vida com suas próprias mãos, e não eram carga para ninguém e, como os leigos, eram por toda parte obedientes aos pastores das igrejas - agora, porém, o mundo todo vê e sabe a que são semelhantes. Eles formulam não sei que votos; mas levam vida totalmente contrária aos seus votos, de modo que os melhores deles merecem ser incluídos entre aqueles de quem o apóstolo fala: “Estamos informados de que entre vós há pessoas que andam desordenadamente, não trabalhando” etc. (II Tes 3.11 ). Portanto, não temos tais pessoas em nossas igrejas, nem ensinamos que devem existir nas igrejas de Cristo.
Os ministros devem ser chamados e eleitos. Ninguém deve usurpar a honra do ministério eclesiástico; isto é, apoderar-se dele por suborno ou quaisquer enganos, ou por sua própria escolha. Que os ministros da Igreja sejam chamados e eleitos por eleição legal e eclesiástica; isto é, que sejam eleitos escrupulosamente pela Igreja ou por aqueles que dela receberam delegação para tal fim, na devida ordem, sem qualquer tumulto, divisões ou rivalidade. Não se eleja qualquer um, mas homens idôneos, que se distingam por suficiente cultura sagrada, piedosa eloqüência, sabedoria simples, e por fim, pela moderação e reputação honrada, segundo a regra apostólica fixada pelo apóstolo em I Tim, cap. 3, e Tit, cap. 1.
Ordenação. E os que foram eleitos sejam ordenados pelos anciãos com orações públicas e imposição das mãos. Aqui condenamos todos quantos concorrem por conta própria, não sendo nem escolhidos, nem enviados, nem ordenados (Jer. cap. 23). Condenamos os ministros ineptos e os desprovidos dos dons necessários a um pastor.
Ao mesmo tempo, reconhecemos que a inocente simplicidade de certos pastores na Igreja Antiga por vezes aproveitou mais à Igreja do que a erudição multiforme, refinada e elegante mas demasiado infatuada de outros. Por esse motivo não rejeitamos, nem mesmo hoje, a simplicidade honesta de alguns, que não é, porém, de modo algum ignorante.
O sacerdócio de todos os crentes. Sem dúvida, os apóstolos de Cristo designam todos os que crêem em Cristo como “sacerdotes”, não por causa de qualquer ofício, mas porque, por Cristo, todos os fiéis, feitos reis e sacerdotes, podemos oferecer sacrifícios espirituais a Deus (Êx 19.6; I Ped 2.9; Apoc 1.6). Portanto, o sacerdócio e o ministério são bem diferentes um do outro. O sacerdócio, como acabamos de dizer, é comum a todos os cristãos; o mesmo não acontece com o ministério. Nem abolimos o ministério da Igreja pelo fato de termos repudiado o sacerdócio papístico da Igreja de Cristo.
Sacerdotes e sacerdócio. Sem dúvida nenhuma, na nova aliança de Cristo não existe mais essa forma de sacerdócio como existia entre o povo antigo; o qual incluía unção externa, roupagens santas e inúmeras cerimônias que eram tipos de Cristo, que aboliu tudo isso pela sua vinda e cumprimento desses tipos. Mas ele mesmo permanece o único sacerdote para sempre e para não subtrairmos qualquer coisa dele, não chamamos sacerdote a nenhum dos ministros. Pois o próprio Senhor nosso não nomeou nenhum sacerdote na Igreja do Novo Testamento, que, tendo recebido autoridade do sufragâneo, ofereçam sacrifício diariamente, isto é, a própria carne e sangue do Senhor, pelos vivos e mortos, mas ministros que ensinem e administrem os sacramentos.
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"Se amássemos mais a glória de Deus, se nos importássemos mais com o bem eterno das almas dos homens, não nos recusaríamos a nos engajar em uma controvérsia necessária, quando a verdade do evangelho estivesse em jogo. A ordenança apostólica é clara. Devemos “manter a verdade em amor", não sendo nem desleais no nosso amor, nem sem amor na nossa verdade, mas mantendo os dois em equilíbrio (...) A atividade apropriada aos cristãos professos que discordam uns dos outros não é a de ignorar, nem de esconder, nem mesmo minimizar suas diferenças, mas discuti-las." John Stott
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