O paradoxo do arrependimento

C. S. Lewis
Em que tipo de "buraco" caíra o homem? Ele procurara ser auto-suficiente e se comportara como se pertencesse a si mesmo. Em outras palavras, o homem decaído não é simplesmente uma criatura imperfeita que precisa ser melhorada; é um rebelde que precisa depor as armas. Depor as armas, render-se, pedir perdão, dar-se conta de que tomou o caminho errado, estar disposto a começar uma vida nova do zero — só isso pode nos "tirar do buraco". Esse processo de rendição, movimento de marcha a ré a toda velocidade, é o que o cristianismo chama de arrependimento. 

Mas, veja só, o arrependimento não é nada agradável. E bem mais difícil que simplesmente engolir um sapo. Significa desaprender toda a presunção e a obediência à vontade própria que nos foram incutidas por milhares de anos; significa matar uma parte de si mesmo e submeter-se a uma espécie de morte. Na verdade, só um homem bom pode arrepender-se. E isso nos leva a um paradoxo. Só uma pessoa má precisa do arrependimento, mas só uma pessoa boa consegue arrepender-se perfeitamente. Quanto pior você é, mais precisa do arrependimento e menos é capaz de arrepender-se. 

A única pessoa capaz de arrepender-se perfeitamente seria uma pessoa perfeita - e não precisaria fazê-lo em absoluto. Lembre que esse arrependimento, essa entrega voluntária à humilhação e a um tipo de morte não é algo que Deus exige de nós para que nos aceite de volta ou algo do qual pode nos livrar, se assim decidir. É simplesmente uma descrição de como é o próprio retorno a Deus. Se pedimos que ele nos aceite sem esse arrependimento, estamos na verdade pedindo para voltar sem voltar. Não é possível. Pois muito bem, temos de nos arrepender. Entretanto, a maldade que nos faz precisar disso nos impede de fazê-lo.

C. S. Lewis
Cristianismo puro e simples

NE: E agora José?

Um comentário:

  1. "Quanto pior você é, mais precisa do arrependimento e menos é capaz de arrepender-se"

    O maior dos pecadores pode se arrepender pois isto não vem do pecador mas de Deus. Realmente um paradoxo que pode ser respondido facilmente se introduzir o próprio Deus no processo de arrependimento através da fé.

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"Se amássemos mais a glória de Deus, se nos importássemos mais com o bem eterno das almas dos homens, não nos recusaríamos a nos engajar em uma controvérsia necessária, quando a verdade do evangelho estivesse em jogo. A ordenança apostólica é clara. Devemos “manter a verdade em amor", não sendo nem desleais no nosso amor, nem sem amor na nossa verdade, mas mantendo os dois em equilíbrio (...) A atividade apropriada aos cristãos professos que discordam uns dos outros não é a de ignorar, nem de esconder, nem mesmo minimizar suas diferenças, mas discuti-las." John Stott

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