Três perguntas para você


Pois, quem torna você diferente de qualquer outra pessoa? O que você tem que não tenha recebido? E se o recebeu, por que se orgulha, como se assim não fosse? (1Co 4:7 NVI)
Paulo dirige três perguntas aos orgulhosos coríntios, que consideravam-se superiores aos outros, seja por serem discípulo deste ou daquele apóstolo, seja por terem este ou aquele dom. Mas as perguntas não são cabíveis apenas à igreja corintiana, precisamos considerá-las como se dirigidas diretamente a cada um de nós. Ainda que não as respondamos publicamente.

Quem torna você diferente de qualquer outra pessoa? Não há diferença essencial entre duas pessoas. E espiritualmente falando, todos nascemos na mesma condição. "Como o pecado entrou no mundo por um homem, e pelo pecado a morte, assim também a morte veio a todos os homens, porque todos pecaram" (Rm 5:12), todas as pessoas se encontram na mesma situação, "não há diferença entre judeus e gentios" (Rm 10:12), pois "todos pecaram e separados estão da glória de Deus" (Rm 3:23). Não importa o gênero, não interessa a idade, classe socio-econômica ou raça não distingue uma pessoa diante de Deus quanto à aceitação ou capacidade, melhor dizendo, incapacidade de agradá-lo.

Porém, a pergunta do apóstolo pressupõe uma diferença. Toda a humanidade divide-se em classes: os perdidos e os salvos, sendo que estes últimos pertenciam anteriormente ao primeiro grupo. "Anteriormente, todos nós também vivíamos entre eles, satisfazendo as vontades da nossa carne, seguindo os seus desejos e pensamentos. Como os outros, éramos por natureza merecedores da ira" (Ef 2:3). Portanto, existe "diferença entre o justo e o ímpio, entre os que servem a Deus e os que não o servem" (Ml 3:18). Essa diferença que não existia antes passou a existir. Iguais em pecado e culpa, tornam-se diferentes e justificados, num dizer, os salvos sobressam-se do contingente de perdidos. A diferença resultante não é negada, mas o causador dela é que se investiga.

O que você tem que não tenha recebido? Da pergunta conclui-se que a diferença não se deve a nada essencial ou inerente a você. Não é algo que você ou contém em sua natureza, mas algo que você passa a possuir. O que diferencia o salvo do perdido não é nada em sua constituição, mas a fé depositada na pessoa e obra de Jesus Cristo. Mas mesmo essa mesma fé não é própria de todos os homens, nem mesmo de alguns homens, mas é recebida como presente. "Pois vocês são salvos pela graça, por meio da fé, e isto não vem de vocês, é dom de Deus" (Ef 2:8). A fé, e tudo o mais que precisamos para nossa vida na terra e felicidade no céu nos é dada pelo Senhor, pois o "Seu divino poder nos deu todas as coisas de que necessitamos para a vida e para a piedade, por meio do pleno conhecimento daquele que nos chamou para a sua própria glória e virtude" (2Pe 1:3).

Tampouco é o caso de dizermos que Paulo está enfatizando o fato de você ter recebido e que este ato que te diferencia. Fosse assim, o seu esforço para corrigir o orgulho espiritual seria anulado pela própria afirmação e sua pergunta seguinte perderia sentido. O motivo pelo qual a fé e tudo o mais que compõe a salvação é um dom de Deus é exatamente "para que ninguém se glorie" (Ef 2:9). Isto nos leva para a próxima pergunta:

E se o recebeu, por que se orgulha, como se assim não fosse? Recapitulemos. Como pecador, você era exatamente igual aos filhos da ira, na verdade, era um deles. Então Deus te deu o Espírito Santo e a fé, e assim você foi diferenciado dos demais, passando a ser filho de Deus. O perigo agora é que você, olhando para a sua nova posição diante de Deus, venha a se orgulhar, como se de alguma forma tivesse contribuído para estar onde e como está. Paulo está mostrando o absurdo disso, uma vez que você era tão pecador quanto os demais e que não foi aceito como justo diante de Deus devido à sua vontade boa, inteligência superior ou bom uso de seu arbítrio. Não foi nada que você tivesse ou que viesse a ter de si mesmo que te diferenciou dentre os pecadores, mas Deus te fez diferente por meio daquilo que te deu.

Sendo assim, "onde está, então, o motivo de vanglória? É excluído. Baseado em que princípio? No da obediência à lei? Não, mas no princípio da fé" (Rm 3:27). Duas coisas contribuem para que todo motivo de orgulho seja aniquilado. Negativamente, o fato de que você não era capaz, nem mesmo potencialmente capaz, de obedecer a Lei. Nisto, você era tal e qual o pior dos pecadores. Positivamente, a fé que te diferencia diante do tribunal de Deus é um dom, que lhe foi dado incondicionalmente, portanto, conta crédito para Deus e não para você. Você é humilhado por falhar na obediência da Lei e Deus é glorificado por te salvar mediante a fé, como presente imerecido Dele.

As respostas às três perguntas são as seguintes. A primeira questão deve ser respondida afirmando-se que é Deus quem nos diferencia. A resposta da segunda é que não temos nada que Deus, graciosamente não nos tenha dado. E finalmente, a última pergunta não pede resposta. Mas reconhecimento que do Senhor é a salvação, por Jesus Cristo que é o Autor e Consumador da fé que nos salva.

Soli Deo Gloria

8 comentários:

  1. O perigo agora é que você, olhando para a sua nova posição diante de Deus, venha a se orgulhar, como se de alguma forma tivesse contribuído para estar onde e como está.

    E isto realmente faz alguma diferença?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. O que você acha? O orgulho é algo indiferente ao cristão?

      Em Cristo,

      Clóvis

      Excluir
    2. Eu? O que eu acho? Não, minha opinião não importa. O que importa é: por que fugir do orgulho, se é que é mesmo possível fugir do orgulho?

      Pelo único Inocente,
      Credulo

      Excluir
  2. Crédulo.

    Claro que é possível fugir do orgulho, afinal de contas não é isso que faz aquele que exerce a verdadeira fé reconhecendo que a sua salvação vem unicamente de Deus?

    Aqui você questiona o Clóvis, no entanto ele parafraseia o que Paulo escreveu à orgulhosa igreja de Corinto, ou seja, por tabela você questiona Paulo se faz alguma diferença o que ele escreveu em sua epístola, afinal de contas "é mesmo possível fugir do orgulho?"

    Quer ver?

    Paulo pergunta:

    "Pois, quem torna você diferente de qualquer outra pessoa? O que você tem que não tenha recebido? E se o recebeu, por que se orgulha, como se assim não fosse? (1Co 4:7 NVI)"

    Crédulo questiona:

    "E que diferença isso faz Paulo?"

    Creio que faz toda a diferença, caso contrário ele não tocaria neste assunto na epístola que escreveu à orgulhosa igreja de Corinto.

    Deus te abençoe.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Na verdade é uma pergunta mais introspectiva.
      É algo acerca da necessidade do homem e principalmente da disposição que Deus tem em suprir esta necessidade.

      Excluir
    2. Helio,

      Bom ve-lo de volta por aqui. Deus o abençoe, amado.

      Em Cristo,

      Clóvis

      Excluir
  3. Clóvis,

    Paulo não está falando de alguma diferença entre todos os homens, nem que todos nascem na mesma condição, filhos da ira, sendo que a diferença é que uns recebem fé e outros não, e que por isso ninguém pode vangloriar-se. Ele está falando exclusivamente dos crentes, da posição/dom que cada um ocupa/tem no Corpo de Cristo.

    A questão aí não é que é Deus quem diferencia um crente de um incrédulo, mas que é Deus quem distribui dons e funções dentro da Igreja conforme for de sua vontade, de forma que uns (com funções ou dons julgados mais importantes) não podem sentir-se superiores aos outros, como se a eminência de sua função ou dom fosse característica deles próprios.

    ResponderExcluir

"Se amássemos mais a glória de Deus, se nos importássemos mais com o bem eterno das almas dos homens, não nos recusaríamos a nos engajar em uma controvérsia necessária, quando a verdade do evangelho estivesse em jogo. A ordenança apostólica é clara. Devemos “manter a verdade em amor", não sendo nem desleais no nosso amor, nem sem amor na nossa verdade, mas mantendo os dois em equilíbrio (...) A atividade apropriada aos cristãos professos que discordam uns dos outros não é a de ignorar, nem de esconder, nem mesmo minimizar suas diferenças, mas discuti-las." John Stott

Sua leitura deste post muito me honrou. Fique à vontade para expressar suas críticas, sugestões, complemetos ou correções. A única exigência é que seja mantido o clima de respeito e cordialidade que caracteriza este blog.