Um coração mau e infiel


"Vede, irmãos, que nunca haja em qualquer de vós um coração mau e infiel, para se apartar do Deus vivo. Antes, exortai-vos uns aos outros todos os dias, durante o tempo que se chama Hoje, para que nenhum de vós se endureça pelo engano do pecado" Hb 3:12-13

Alguém me perguntou "como o irmão entende o texto de Hebreus 3.12,13?", dando em seguida seu entendimento de que "mesmo um coração habitado pelo Espírito pode se tornar duro, infiel e mau". Não vou me deter na análise de sua conclusão, dedicando-me a responder a sua pergunta.

Uma prática obrigatória na interpretação da Bíblia é considerar uma passagem à luz de seu contexto. No caso, interessa-nos particularmente os capítulos 3 e 4 de Hebreus.

O escritor se dirige a "irmãos santos, participantes da vocação celestial" (3:1), portanto é indubitável que escrevia a crentes. Estes são os mesmos "irmãos" do verso 12 a quem disse "que nunca haja em qualquer de vós um coração mau e infiel, para se apartar do Deus vivo". Não podemos enfraquecer a força dessa advertência, dizendo que o crente não precisa vigiar, tendo em mente o que aconteceu na sedição de Cades (Nm 14), quando Deus "jurou que não entrariam no seu repouso" (3:18). Até este ponto creio que não temos que divergir. Mas ele basta para afirmarmos que "um coração habitado pelo Espírito pode se tornar duro, infiel e mau"? Creio que um exame mais cuidadoso responde negativamente.

Embora se dirigisse a uma congregação de crentes, o escritor estava consciente de que alguns dentre eles poderiam não serem crentes genuínos. Tomando o exemplo utilizado pelo autor, ele diz que "havendo-a alguns ouvido, o provocaram; mas não todos os que saíram do Egito por meio de Moisés" (3:16). O que distinguiu Moisés, Josué e Calebe dos que pereceram no deserto não foi o fato de fazerem parte da congregação do deserto nem o ter ouvido a Palavra de Deus, mas a genuína fé, característica dos nascidos de novo. Hebreus é clara quanto a isso: "porque também a nós foram pregadas as boas novas, como a eles, mas a palavra da pregação nada lhes aproveitou, porquanto não estava misturada com a fé naqueles que a ouviram" (4:2).

Visto exteriormente, como o homem vê, quando pessoas da congregação endurecem seu coração e perecem na incredulidade, parece que foram crentes nascidos de novo que se endureceram até a completa apostasia. Mas é apenas uma aparência externa, como bem expressa o escritor ao dizer "temamos, pois, que, porventura, deixada a promessa de entrar no seu repouso, pareça que algum de vós fica para trás" (4:1, grifei). Apesar dessa aparência, os verdadeiramente nascidos de novo podem afirmar "porque nós, os que temos crido, entramos no repouso" (4:3). A prova de que "nos tornamos participantes de Cristo" é retermos "firmemente o princípio da nossa confiança até ao fim" (3:14).

O escritor indica dois antídotos para o risco de endurecimento daqueles que misturados ao povo ainda não nasceram de novo. Um deles é "exortai-vos uns aos outros todos os dias, durante o tempo que se chama Hoje, para que nenhum de vós se endureça pelo engano do pecado" (3:13). Além da ajuda mútua, temos a infalível intercessão de Jesus, nosso Sumo-Sacerdote: "porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém, um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado. Cheguemos, pois, com confiança ao trono da graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno." (4:15-16).

11 comentários:

  1. Boa resposta, Clóvis!
    Você deu uma boa base sobre o "contra-arminianismo". E, de quebra, mencionou o antídoto (para usar um termo seu) para o "contra-hipercalvinismo" (todos, ou quase todos, que não são calvinistas nos enxergam assim) e uma acusação que nos fazem sempre. Dizem: "se uma vez salvo, sempre salvo, o que os impede de pecar?" A interpretação que você faz, e que é minha também, é não de perda da salvação, mas de que devemos "provar" nossa salvação fugindo do pecado pela graça de Deus. Pois enganoso é nosso coração... Cuidemos para que não estejamos no erro de, pensando ser salvos, estarmos de fato com um coração duro, mal e infiel!

    Grande abraço, no Senhor,
    Roberto

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  2. gostaria de lhe propor um desafio pastor.
    é claro que nao contra mim,hehehe, e nao so ao vc mas À todos os calvinistas que conheço pela net
    é o seguinte
    gostaria de ver estudos feitos p cada proprietario de blog sobre a passagem de hebreus 6, akela que os arminianos alegam a perda da salvaçao.
    Sera que o senhor poderia contribuir com sua participaçao Clovis:?
    de todas as interpretaçoes que vi ate hoje, a que eu mais achei que se encaixou melhor no texto foi uma arminiana e que vi no blog do pastor zwinglio.
    muito obrigado pela atençao,abraços

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  3. Vinicius,

    Seja bem vindo por estas bandas. Só esclarecendo, não sou pastor, é algo elevado demais para mim. Só apenas um fazedor de salsichas que se bota a falar das coisas de Deus.

    Sobre o desafio, há boas respostas dadas pelos calvinistas sobre as dificuldades levantadas por essa passagem. Recomendo a de Wayne Grudem, com quem concordo.

    Mas independente de desafio, conforme Deus for dando graça, abordarei, às vezes diretamente outras incidentalmente, os versículos que os arminianos usam contra a causa dos reformados. Na barra lateral (à direita) você encontra algumas das passagem abordadas, outras se somarão com o passar do tempo.

    Em Cristo,

    Clóvis

    PS.: E sobre Hb 3:12-13, acima, qual sua opinião a respeito?

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  4. obrigado pela receptividade Clovis
    bom , eu sou calvinista mas de pouco tempo e nao tenho tanta pratica.
    eu conheço a explicação do Grudem sobre o versiculo, mas depois que vi as duas explicaçoes arminianas dakela passagem eu simplesmente fiquei sem pra onde correr, simplesmente arrebentou o Grudem.
    vou posta-las pra vc:

    http://www.revistatheos.com.br/Artigos/Artigo_06_02.pdf

    http://blogs.gospelprime.com.br/dokimos/uma-exegese-de-hebreus-64-6-parte-1

    eis os dois textos
    obrigado pela atençao Clovis
    abraços

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  5. Vinicius,

    Vou ler os textos indicados e avaliar os argumentos utilizados.

    Em Cristo,

    Clóvis

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  6. Vinícius e Clóvis,
    Olha, eu só vi por cima os textos. Aguardarei o texto de resposta do Clóvis. Mas adianto uma posição.
    Sempre encarei isso como um duplo problema: epistemológico e, por conseqüência, hermenêutico. E tudo passa pelo seguinte: A Escritura se explica pela Escritura.

    O problema epistemológico se relaciona aos axiomas do pensamento. Para resumir, uma questão de ênfase: ou o fundamento é Deus ou o homem. E daí se "escolhem" os textos fundamentais.
    O problema hermenêutico seguirá daí bastante óbvio.

    Na passagem em questão, e olhando apenas para ela, talvez eu fosse arminiano. Mas olhando o todo, partindo do pressuposto de Deus absoluto (primeiro Deus, depois o homem) e interpretando toda a Escritura pelas passagens mais abundantes e claras quanto à segurança de salvação, forço-me a uma interpretação calvinista desta passagem em especial.

    Que fique claro: isso não é torcer a Palavra pelo calvinismo, mas reconhecer que o calvinismo reflete a Escritura. Mesmo que este texto em especial sugira o arminianismo, o todo da Escritura sugere o calvinismo.

    Grande abraço,
    Roberto

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  7. Este texto é particularmente de difícil compreenção, seja pela polidez do grego, ou pelo uso particular que o escritor faz do AT, estou estudando ele já um tempo, tentando me chegar a ele sem preconceitos, mas adianto, ele, se tratado isoladamente do todo da Escritura, é problemático para ambas correntes teológicas.

    Ednaldo.

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  8. Deus falou comigo esta noite,sonhei que alguem me falava este liro da biblia (hebreus),e o capitulo 3 tambem, tenho consciencia que venho , cometendo um pecado, mas Deus me mostrou mais uma vez esta noite, porque ele quer servos fieis.

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  9. o texto de hebreus 6:4-6 é explicado corretamente logo em seguida, nos versos 7 e 8 ...

    abraços...

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  10. o texto de hebreus 6:4-6 é explicado logo em seguida pelos versos 7 e 8 ...

    abraços...

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  11. o texto de hebreus 6:4-6 é explicado corretamente logo em seguida pelos versos 7 e 8 ...

    abraços...

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"Se amássemos mais a glória de Deus, se nos importássemos mais com o bem eterno das almas dos homens, não nos recusaríamos a nos engajar em uma controvérsia necessária, quando a verdade do evangelho estivesse em jogo. A ordenança apostólica é clara. Devemos “manter a verdade em amor", não sendo nem desleais no nosso amor, nem sem amor na nossa verdade, mas mantendo os dois em equilíbrio (...) A atividade apropriada aos cristãos professos que discordam uns dos outros não é a de ignorar, nem de esconder, nem mesmo minimizar suas diferenças, mas discuti-las." John Stott

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